Houve um tempo em que o futebol era a paixão nacional. Os brasileiros podiam ser classificados segundo um critério exclusivamente futebolístico, conforme torciam para um determinado time ou para outro, e essa paixão se estendia aos jogadores, também venerados, ao tempo, pois, em que a opinião pública estava rigorosamente dividida entre aqueles que acreditavam que Zico era, depois de Pelé naturalmente, o nosso melhor jogador, enquanto outros estavam convencidos que esse posto cabia a Sócrates, refletindo uma divisão que acabava envolvendo todo o país, para além dos cariocas e paulistas.
Mas aquela paixão nacional por algum motivo arrefeceu, e como é natural, foi substituída por outra, a confirmar o que os cientistas sociais enfatizam quanto à eterna necessidade do ser humano de contar com alguma paixão, trocando-a quando a antiga já não mais o satisfaz.
Assim é que a política se tornou hoje a nossa paixão nacional, alimentada por uma polarização jamais vista em nosso país, em que lulistas e bolsonaristas se tornaram apaixonados torcedores, com sentimentos semelhantes àqueles dos torcedores de futebol, senão que com sentimentos ainda mais fortes.
E como a paixão, qualquer que seja seu objeto, precisa ser constantemente alimentada, o julgamento que hoje se inicia no Supremo Tribunal Federal, envolvendo o ex-presidente Bolsonaro, forma o combustível perfeito para que a política se mantenha por muitos anos como a paixão nacional, dominando o imaginário popular, já acostumado a jargões até então de uso exclusivo por juízes e advogados, que, aliás, não reclamam, porque entendem que isso acaba por valorizar o mundo do direito.
Mas os políticos, estes não veem com bons olhos essa recente predileção popular pela política. Sentem-se invadidos, observados, vigiados, fiscalizados, e isso claramente os incomoda, e atribuem às redes sociais esse fenômeno, o que explica a vontade em regulá-las, para as censurar.
Com certa dose de razão, dizia-se que o futebol era a coisa mais importante dentre aquelas que não tinham nenhuma importância. Mas quanto a esta nova paixão nacional, a política, não há negar que ela sim é a mais importante dentre as que realmente são importantes. E isso basta para que saudemos essa nova paixão nacional, que certamente trará grandes frutos para a nossa sociedade.