Árdua tarefa a do intérprete do Direito, tantos são  os sentidos que se podem extrair  de uma simples palavra como, por exemplo, “boa-fé”. Mas,  ainda mais árdua é a tarefa imposta ao cientista político, que se vê em grande dificuldade em precisar o que se deve entender por exemplo com as palavras “revolução” e “golpe”.

Com efeito, se perguntássemos aos militares que assumiram o governo em 1964 se havia ocorrido um golpe militar, eles certamente diriam, e ainda hoje dizem que não, rejeitando veementemente o emprego da palavra “golpe” naquele importante episódio de nossa história. Se então formulássemos uma segunda pergunta àqueles militares, indagando se o governo que então se instalara no Brasil era uma “ditadura”, também rechaçarão esse termo.

Mas se estivéssemos interessados em ampliar o universo de nossos entrevistados, e então quiséssemos saber de uma parte da população brasileira o que viam em 1964, afirmariam com segurança que, sim, houvera um golpe e com ele instalada uma democracia. E se formos consultar uma preciosa obra como a de THOMAS SDKIMORE (“Brasil: De Getúlio a Castelo”) encontraremos fatos históricos que permitem mais de uma visão sobre eles.

Tratar-se-ia de termos que comportam sentidos tão variados que permitiriam afirmar, e negar ao mesmo tivesse havido um golpe em 1964, e que isso depende exclusivamente da perspectiva de quem olha determinados fatos políticos?

Vejamos um episódio mais recente, ocorrido em 2016, quando a presidenta Dilma foi afastada da presidência da república em razão de um processo de impeachment que se lhe instaurou. Veremos que a opinião entre os especialistas não é uniforme: para uns houve golpe; para outros não.

Talvez que a explicação (ou o problema) esteja nos dicionários, que abonam para a palavra “golpe” sentidos os mais variados, como registra HOUAISS, ao dizer que “golpe” é “um movimento pelo qual um corpo vem a chocar-se com outro”; ou ainda “o ato de derrubar ou dar fim a alguém ou alguma coisa”, ou mesmo “ação ou manobra desleal”, não se podendo esquecer que HOUAISS ainda registra, por associação, a locução “golpe de Estado”.

Depois das eleições presidenciais ocorridas no último domingo, a palavra “golpe” ressurgiu e trazendo com ela um novo sentido, que os dicionários ainda não abonam. Seria “golpe” o defender que, se mantenham os resultados das urnas, mas que se instale um Poder Moderador a ser exercido pelos militares? Estamos diante de uma nova situação política, para a qual não saberíamos dizer qual a palavra mais adequada.

Encerramos por aqui, lembrando do que dizia o romancista francês, PIERRE MAC ORLAN (1882-1970): “As palavras são mais misteriosas que os fatos”.

 

 

 

 

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