Se atribuíssemos a alguém do povo a tarefa de dizer o que lhe parece possa ser considerado como inconstitucional, esse termo jurídico tão pouco conhecido quanto maior tem sido as vezes em que os jornais dele se utilizam, se, pois, pedíssemos-lhe que buscasse se recordar das vezes em que, pelos jornais, deparara-se com esse termo, ele certamente se recordaria de algumas tantas situações em que uma lei foi declarada inconstitucional, também se recordando de outras situações em que, ao contrário, a lei foi declarada constitucional, mas de qualquer modo ele não conseguiria atinar por qual razão o tribunal havia decidido de um jeito ou de outro, e assim, diante de algo tão variável, ele certamente não poderia dizer o que devesse ocorrer.
Nosso personagem poderia se lembrar que, recentemente, leis que haviam instituído planos econômicos em nosso país haviam sido reconhecidas como constitucionais, malgrado um elenco bastante extenso de aspectos que, na visão segura de muitos juristas, tornavam aquelas leis manifestamente inconstitucionais.
Mas afinal o que torna uma lei inconstitucional, ou o que a faz constitucional? Que razões devem conduzir a uma decisão em um sentido ou noutro? Como observa o juspublicista alemão, ROBERTO ALEX, as normas de direitos fundamentais são flexíveis, dúcteis, e isso porque é impossível eliminar o grau de incerteza que naturalmente envolve as palavras e as expressões que formam o conteúdo das normas constitucionais que criam esses direitos fundamentais. O mesmo se pode dizer, portanto, da ideia de constitucionalidade/inconstitucionalidade.
Mas se vamos às razões que estruturam uma decisão judicial, qualquer que ela seja, e assim à decisão judicial que declara uma lei como inconstitucional, e se realizarmos algo como um “desconstrução” à maneira do filósofo francês JACQUES DERRIDA, podemos identificar a ideologia por trás da figura do julgador. É pela linguagem, como dizia DERRIDA, que se pode “desestabilizar as estruturas” do pensamento, surpreendendo-o em sua ideologia, mesmo quando ela procura se ocultar por meio de uma linguagem que se revela intencionalmente técnica ou cifrada. A ideologia estará sempre presente. Basta procurar melhor, que ela surge. Algo como um “eterno retorno”. A “leveza do ser inconstitucional” está precisamente aí. Talvez se possa compreender por qual razão uma grande parte dos juristas tem verdadeira ojeriza à Filosofia.