Ninguém, em boa verdade, conseguia atinar em que aquele magistrado havia pensado quando, em uma decisão, invocara o “princípio democrático” para conceder uma medida liminar. O magistrado dissera singelamente que, “em atenção ao princípio democrático”, a medida liminar deveria ser concedida, e assim foi. Atônitos, os juristas se perguntavam sobre o que seria aquele novo princípio, novo sim porque antes da referida decisão ninguém em tempo algum havia cogitado pudesse existir um princípio que, no Direito, pudesse ser chamado de “princípio democrático”.
Começou assim uma interessante discussão, inicialmente entre os entendidos, logo estendida à opinião pública. Alguns, dentre os juristas, afirmavam que já haviam desconfiado de que pudesse haver um princípio a que se devesse dar aquele nome, porque, argumentavam, o fato de existir uma democracia não significava, só por si, que os princípios fossem todos democráticos, pois bem podia acontecer que algum princípio não fosse democrático. Malgrado esse argumento, que parecia de uma irrecusável lógica, houve quem ousasse externar a sua posição, negando veementemente que existisse um princípio como aquele, porque pela simples razão de que se há uma democracia, se o Estado é democrático, é impossível que exista ou possa existir um princípio que não seja tão democrático quanto o próprio Estado.
A discussão foi profunda e intensa, a ponto de ter sido criado um congresso destinado a estudar o que seria o “princípio democrático”. Juristas e não juristas, filósofos, sociólogos e de outras ciências foi chamados a debaterem o tema. E foi então que alguém se lembrou de convidar o magistrado que havia descoberto aquele princípio jurídico, para que pudesse esclarecer ao dileto público em que teria ele pensado ao criar essa maravilha jurídica, algo que poderia, quem sabe, ser reconhecido pela comunidade jurídica como uma descoberta que poderia revolucionar o mundo do Direito.
Mas o magistrado recusou ao convite, alegando que a lei não lhe permitia falar sobre o tema e que ele só deveria explicação à sua consciência. O fato é que isso não impediu que a opinião pública continuasse a debater sobre o tema, e há quem esteja até hoje a tentar entender o que é o “princípio democrático”, mesmo depois de ter ouvido o Conselheiro Acácio afirmar com pompa e circunstância que o “princípio democrático não é senão que a democracia em pleno movimento”.