Assim pensa uma alta autoridade brasileira, conforme disse com veemência ao palestrar para grandes investidores. Para essa alta autoridade, o “bom juiz é o que não aparece“, e quanto menor o grau de criatividade de um juiz maior é o nível de segurança jurídica. Essa alta autoridade não disse, mas é de se supor tenha ela se utilizado de uma similitude com aquilo que se espera de um juiz de futebol, que, segundo os comentaristas esportivos, não pode aparecer mais que os jogadores. Assim, o bom juiz – o de direito, e não o de futebol – não deve aparecer.
O palestrante, como todo bom palestrante, deve saber o público para o qual fala. E não há dúvida de que o público para o qual a alta autoridade falou não podia ser mais apropriado. Se há um segmento ao qual não interessa que o juiz seja criativo, esse segmento é o dos investidores, que querem, por óbvio, prevaleça aquilo que, por meio de lobbies, conseguiram transformar em lei, não sendo admissível que um juiz possa dizer o contrário do que disse a lei. Evidentemente que as palavras da digna alta autoridade agradaram em cheio os investidores, ansiosos que sempre estão por terem a garantia de que possam aumentar seus lucros, e melhor ainda quando a lei isso lhes propicia. Afinal, não há nada melhor do que a segurança jurídica, especialmente daquela que nos beneficia.
Mas o que se entende por um juiz que não deve aparecer? Ou, como identificar um juiz criativo? Segundo disse a alta autoridade no evento aos investidores, o juiz que “inova na ordem jurídica gera instabilidade e insegurança na sociedade”. Devemos pressupor, pois, que “inovar” é um grande pecado que o juiz deve evitar cometer, o que significa que ele deve interpretar a lei literalmente, jamais indo para onde o Legislador não foi. Mas o deve fazer o juiz quando o Legislador não foi a lugar nenhum, ou ainda quando ele foi a muitos lugares, como faz quando se vale de conceitos indeterminados, como, por exemplo, o da boa-fé? Como não ser criativo diante desse tipo de norma legal? E no caso do sempre lembrado, mas pouco utilizado artigo 5o. da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, segundo o qual “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”, o que deve fazer o juiz para não aparecer?
O bom juiz é aquele que pensa e considera todas as perspectivas hermenêuticas, para além daquela que o Legislador inseriu na lei, buscando fazer justiça no caso em concreto. O bom juiz é aquele que é livre para pensar e para julgar, e que não se prende a nenhum grupo de interesse, seja de natureza religiosa, econômica ou de qualquer outra ordem. É e deve ser livre, inclusive para aparecer quando é impossível evitar que isso ocorra, porque, no mundo das redes sociais, as informações não circulam, elas voam, inclusive para divulgar o que foi dito aos investidores.