Ao introduzir em nosso direito positivo o instituto das súmulas e teses vinculantes, o Legislador brasileiro pretendeu gerar nos operadores jurídicos a ilusão de que há dois momentos diversos e completamente separados no tempo, envolvendo a criação da norma jurídica e de sua aplicação, e que ao dotar os tribunais do poder de tornar vinculantes as decisões que proferem, não se está a criar a norma legal, mas apenas a aplicá-la, de maneira que não haveria qualquer inconstitucionalidade em conceder tal poder aos tribunais, porque eles não estariam a criar a norma legal para uma aplicação geral, usurpando um poder que é de ser conferido apenas ao Poder Legislativo.
Mas olvidou o Legislador brasileiro de uma preciosa lição do genial filósofo, LUDWIG WITTGENSTEIN (1889-1951), que afirma inexistir algo como um momento isolado de aplicação de uma regra, porque o momento em que se a aplica faz parte da própria regra, do que se deve concluir que, ao fixar uma súmula ou tese, dotando-a de efeito vinculante, o tribunal não está apenas a aplicar uma determinada norma legal, senão que está a criá-la, porque não há como dissociar os momentos de criação de uma norma legal e de sua aplicação, porque em cada momento que se aplica uma regra se está a criá-la novamente, porque não há como eliminar a produção de sentido que é imanente à interpretação. Assim, quando o juiz, interpretando a norma, faz sua aplicação, está ao mesmo tempo a criá-la, porque, como ensina WITTGENSTEIN, não há como isolar o momento de aplicação da regra, como se ele existisse de per si.
Destarte, quando se concede ao Tribunal o poder de dotar de efeitos vinculantes uma decisão, para a fazer aplicada a uma generalidade de casos, não se está apenas a interpretar uma norma legal, aplicada não apenas àquele caso em concreto, de maneira que, ao dotar de efeito vinculante uma determinada decisão, o Poder Judiciário está a criar a norma nos mesmos moldes em que o Poder Legislativo o faz, caracterizando-se uma evidente inconstitucionalidade.