Qual a relação que se pode estabelecer entre o conhecido filósofo francês, MICHEL FOUCAULT e a revisão do nosso Código Civil, cuja comissão foi recentemente criada? Certamente é o que o leitor está a perguntar.

Convém lembrar que, com NIETZSCHE, FOUCAULT aprendeu como o poder utiliza-se frequente,  variada e eficazmente da ilusão de sentido para se favorecer, dando lugar ao fenômeno denominado de “poder biotécnico”, que se caracteriza por um crescente ordenamento de todas as esferas em que o Estado atua sob a alegação de que, impondo a ordem, o bem-estar dos indivíduos pode ser alcançado. É o que está por detrás da revisão do nosso Código Civil, que é um Código surgido em 2002 e que em boa parte manteve as linhas centrais do Código elaborado por um jurisconsulto de escol, CLÓVIS BEVILACQUA, que, ao lado de TEIXEIRA DE FREITAS, são os nossos maiores civilistas.

Ao tempo de MACHADO DE ASSIS, era comum denominar de “jurisconsulto” quem, como TEIXEIRA DE FREITAS, RUI BARBOSA, BEVILACQUA, alcançava um nível extraordinário no conhecimento de uma ciência como a ciência do Direito. Hoje os tempos são outros e como não podemos ser tão exigentes, contentamo-nos com a expressão “jurista”, empregada a torto e a direito para se referir a todos os profissionais do Direito, mesmo aqueles que não possuam qualquer especialização em áreas do Direito, e que sequer tenham  produzido qualquer estudo, ensaio ou livro em que tenham demonstrado um profundo conhecimento do Direito, como do Direito Civil por exemplo.

Ao criar a comissão de juristas destinada a elaborar a proposta de revisão e atualização do Código Civil, escolhendo para a presidir um ministro do Superior Tribunal de Justiça, o Senado Federal entende que há várias áreas do Código Civil de 2002 que estão a merecer uma “atualização”, um simpático termo empregado para esconder o fato de que, em verdade,  essas áreas serão profundamente modificadas, com efeitos que evidentemente impactarão as relações sociais.

O objetivo dessa “atualização e revisão” não é outro senão que o de o Estado avançar sobre áreas que o Código Civil de 2002 deixou sob a proteção do Poder Judiciário, ao estabelecer normas como a do artigo 113, conferindo aos juízes o democrático poder de fazer prevalecer a boa-fé nos negócios jurídicos, criando, contudo, uma área sensível aos interesses da elite econômica, que não confiam muito nos juízes, preferindo que a Lei não lhes conceda poder algum de interpretação, como, aliás, faz prova a recente lei aprovada e que dota do poder de autoexecutoriedade as instituições financeiras e os contratos de alienação fiduciária.

A revisão do Código Civil é claramente uma forma que o Estado encontrou para avançar com seu poder, criando uma falsa sensação de sentido de ordem.

 

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