Enfatizam os juristas, mas apenas aqueles mais atentos como COUTURE, que, em Direito, um princípio é um princípio até o dia em que o conjunto das exceções transforma-se em maioria, quando então as exceções passam a constituir a maioria, e então o princípio deixa de ser princípio, transformado em uma exceção.

A nossa Constituição de 1988, ao dizer que a saúde é direito de todos e dever do Estado criou um princípio: o de que se deve juridicamente proteger a saúde, tanto quanto isso for possível, o que passa pelo acesso de todos às melhores técnicas engendradas pela Ciência Médica. Como todo princípio, esse também tem seu conteúdo extraído e definido pela realidade material subjacente, a qual deve ser também interpretada pelos juízes, e não apenas a norma jurídica.

Controverte-se ainda hoje, e mais intensamente  sobretudo depois de um julgamento do STJ, se o princípio que garante o direito à saúde harmonizar-se-ia com a ideia de que é taxativa a lista de medicamentos, de insumos e de procedimentos médicos fixado pela agência reguladora. A jurisprudência, antes daquele julgamento, havia chegado quase que a um consenso: a lista não é taxativa. Mas depois do julgamento, a controvérsia como que se ressurgiu.

O STJ, com efeito, decidiu (felizmente sem efeito vinculante) que a lista fixada pela agência reguladora é, em regra, taxativa, mas que deixa de o ser quando estiverem caracterizadas, ao mesmo tempo, diversas situações. Assim é que, segundo o STJ, se a agência reguladora não indeferiu expressamente a incorporação do medicamento, do insumo ou do procedimento em seu rol, então nesse caso a lista não é taxativa. Se há comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências, então a lista não é taxativa. E ainda: se tiver sido realizado, “quando possível”, um “diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde”, então nessa hipótese a taxatividade também não prevalecerá como regra, ainda que não seja possível definir, com alguma segurança, o que vem a ser esse “diálogo interinstitucional” que o magistrado deva ter mantido.

São tantas e variadas as exceções criadas por aquele julgamento que o princípio que garante o direito à saúde tornou-se uma exceção.

 

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