“CAPÍTULO IV
– DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.
§ 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.
§ 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica”.

Comentários: começaremos a tratar do instituto da desconsideração da personalidade jurídica com a citação de uma lapidar frase do jurista alemão, PETER ERLINGHAGEN (1932-1994), que, em 1960, ao analisar a responsabilidade do sócio por obrigações contraídas pela pessoa jurídica, sintetizou assim o que constitui a essência desse instituto: “a separação jurídica da sociedade e de seus sócios deixar de existir sempre que – e na medida em que – isso seja necessário para evitar resultados juridicamente condenáveis”. O pensamento desse importante autor alemão é objeto de uma percuciente análise que o professor LAMARTINE CORRÊA DE OLIVEIRA desenvolveu em seu clássico livro “A Dupla Crise da Pessoa Jurídica”, que se constitui em livro de cabeceira para todos aqueles que querem compreender detalhada e profundamente o que é o instituto da desconsideração da personalidade jurídica.

Instituto que ganhou especial relevo quando o Legislador resolveu incorporar de maneira inédita no Brasil ao texto de um código de processo civil a regulação do tema. O CPC/1973 não cuidava, portanto, da desconsideração da personalidade jurídica. Assim, com o CPC/2015 surge uma regulação que, no direito brasileiro, havia aparecido primeiro no Código de Defesa do Consumidor, que é de 1990, e depois no Código Civil que é de 2002. Considerando os momentosos efeitos processuais que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica projeta no campo da relação jurídico-processual, era natural que um código de processo civil tratasse do tema, e o CPC/2015 traz assim, em seus artigos 133-137, disposições não apenas de natureza processual acerca desse instituto.

O artigo 137, com efeito, cuida de um efeito que não é de natureza processual, senão que de direito material, ao estabelecer que, em sendo acolhido o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.

As demais normas do CPC/2015 cuidam apenas dos efeitos processuais que dizem respeito à desconsideração da personalidade jurídica, começando pelo artigo 133, que cuida da legitimação ativa, seja para a desconsideração direta, seja para a desconsideração inversa, sendo esta a que ocorre quando se imputa à pessoa jurídica a responsabilidade pela obrigação de seus sócios, enquanto é mais comum que ocorra o contrário, quando se trata de imputar aos sócios a responsabilidade por obrigações da pessoa jurídica.

O CPC/2015 expressamente remete ao Código de Defesa do Consumidor (artigo 28) e ao Código Civil (artigo 50) a definição das hipóteses nas quais se legitima a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica. O artigo 28, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor, com efeito, prevê que “O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração” – com aplicação à relação jurídico-material objeto da lide que possa ser qualificada como uma relação de consumo.

Para as demais relações jurídico-materiais, o artigo 50 do Código Civil fixa as hipóteses em que a desconsideração da personalidade jurídica deve ocorrer: “Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso”.

Quanto à legitimidade ativa, o artigo 133 prevê que o incidente pode ser instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, no caso em que se justifique a sua intervenção no processo, e o juiz analisará se aquelas situações descritas no Código de Defesa do Consumidor (se a lide for de consumo) e as do Código Civil estão, em tese, presentes, conforme determina o parágrafo 1o. do artigo 133 do CPC/2015. Se estiverem presentes, o juiz determinará a instauração do incidente, a ser formado em autos apartados, salvo na hipótese tratada no parágrafo 2o. do artigo 134 do CPC/2015, quando o pedido de desconsideração tiver sido formulado na peça inicial.

Suspensão: instaurado o incidente, suspender-se-á o trâmite do processo. Mas na hipótese em que não há a instauração formal do incidente (quando pedido na peça inicial), então nessa específica situação o processo prosseguirá, tanto com o exame da lide, quanto da desconsideração da personalidade jurídica.

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