É comum afirmar-se que o CPC/2015 não terá modificado em nada substancial o regime jurídico dos embargos de declaração, ao manter aquelas hipóteses de cabimento que vinham do artigo 535 do CPC/1973, como são as hipóteses de obscuridade, contradição e omissão, além do erro material.

Mas há no artigo 1.022 do CPC/2015 uma mudança importantíssima, trazida com o parágrafo único, inciso II, desse dispositivo. É que os embargos de declaração cabem na hipótese em que se considerará omissa a decisão que incorra em qualquer das condutas previstas no artigo 489, parágrafo 1o., do CPC/2015. E como o Legislador faz presumir que essas condutas estariam abarcadas no conceito de “omissão”, isso fez com que muitos processualistas não tenham percebido a grande mudança no regime dos embargos de declaração.

Com efeito, é possível que, conquanto não exista omissão, a decisão possa ser considerada como não fundamentada naquelas situações previstas no artigo 489, parágrafo 1o., do CPC/2015. Ou seja, o juiz empregou conceitos indeterminados, sem explicar o motivo de sua incidência no caso, hipótese alcançada pelo artigo 489, parágrafo 1o., inciso II, do CPC/2015. Nesse tipo de situação, não se pode falar em omissão, porque o juiz, na decisão ou na sentença, tratou da matéria, embora empregando um conceito indeterminado, não precisando o sentido que desse conceito extraiu para o caso em concreto. Outra hipótese: o juiz invocou motivos tão genéricos que, a rigor, os poderia ter utilizado para justificar uma outra decisão, diametralmente oposta àquela que adotou no caso em questão. Também aqui não se pode falar exista omissão.

Daí se deve concluir que o Legislador expressou-se mal na construção do enunciado normativo do parágrafo único do artigo 1.022 do CPC/2015, ensejando o intérprete a pensar que não se ampliaram as hipóteses de cabimento dos embargos de declaração no CPC/2015, pois que seriam as mesmas hipóteses previstas no artigo 535 do CPC/1973.

Ampliou, e se ampliou muito o número dessas hipóteses, porque não se está mais a falar apenas em omissão, que se configura quando o juiz não decidiu acerca de uma matéria. Está-se a falar agora não em omissão, pois, mas sim em uma decisão não fundamentada, situação que, por óbvio, não se confunde com a da omissão.

Portanto, as hipóteses de cabimento dos embargos declaratórios abrangem não apenas aquelas tradicionais – obscuridade, contradição, erro material e omissão -, senão que passaram a abranger aquelas várias e variadas hipóteses tratadas no artigo 489, parágrafo 1o., do CPC/2015. E aqui surge um novo problema.

Com efeito, se não estamos a falar tecnicamente de omissão, mas de uma decisão não fundamentada, o efeito infringente que é imanente aos embargos declaratórios, mas sempre visto com maus olhos pelos juízes em geral, esse efeito passa a ser o mecanismo indispensável para que o tribunal decida melhor aquilo que o juiz decidiu sem fundamentação.

(*prosseguiremos com a análise desse interessante tema em uma outra publicação.)

 

 

2 COMENTÁRIOS

  1. Caro Professor Valentino. A observação consoante ao art. 489, §1º, seja a ausência de fundamentação teria não tornado a sentença nula em face ao art. 11, também do CPC?
    A abordagem referente a questão de fundamentação sentencial é de relevante interesse para todos os operadores do Direito. Aguardo com relevante e aguçada curiosidade a continuidade desta matéria.
    Renato Borges

    • Bom dia, Renato. São situações distintas, embora existam pontos de contato. No CPC/1973, não havia uma norma como a do artigo 489, parágrafo 1o., do CPC/2015, e como o CPC/2015 incorporou a seu texto princípios constitucionais (artigo 8o.), foi obrigado, por uma questão lógica e de coerência, a estabelecer em seu artigo 11 o dever de fundamentação, extraindo daí outras consequências, as quais chegaram aos embargos de declaração, os quais assim passaram a abranger aquelas hipóteses do artigo 489, parágrafo 1o. O que surge daí: a importância do efeito infringente, com o qual o Tribunal pode fundamentar aquilo que o juiz não fundamentou, o que faz implementar o princípio da eficiência, na medida em que é tanto melhor que se tenha um provimento jurisdicional integrado por uma decisão em embargos declaratórios, que uma decisão nula e que terá ser feita pelo juiz de primeiro grau. Aproveita-se, pois, o que o juiz decidiu, e o Tribunal, nos embargos declaratórios e com efeito infringente, complementa o necessário. Sua questão é interessante, pois. Um abraço.

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