“TÍTULO V
– DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Art. 176. O Ministério Público atuará na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses e direitos sociais e individuais indisponíveis”.

Comentários: ao longo do CPC/2015, são noventa e duas as normas que se referem ao Ministério Público e ao papel que lhe cabe realizar no processo civil. Se compararmos com o CPC/1973, no qual o Ministério Público era mencionado em setenta e três normas, constatamos que esse aumento no número de normas é o resultado de uma maior importância que o Ministério Público assumiu ao longo do tempo no processo civil.

Em sua grande maioria, as normas do CPC/2015 dizem respeito a função que o Ministério Público realiza como fiscal da lei (“custos legis”), quando lhe cabe, segundo o artigo 176, atuar na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses e direitos sociais e individuais indisponíveis, atuando, pois, como “custos legis” naquelas ações cíveis em que se caracteriza a presença do interesse público, ou quando há  uma especial razão que tenha sido levada em consideração para que o Legislador considerasse como obrigatória a intervenção do membro do Ministério Público no processo civil, lembrando que o artigo 279 do CPC/2015 fixa como causa de nulidade do processo a hipótese da ausência de intervenção do Ministério Público.

A propósito dessa expressão “membro do Ministério Público”, que está presente em dez normas do CPC/2015, é importante observar que tal expressão, que aparecia uma única vez no texto do CPC/1973 (artigo 690-A), revela uma compreensão mais ajustada ao que representa hoje, no campo do processo civil, o princípio da unidade do Ministério Público, previsto no artigo 127, parágrafo 1o., da Constituição da República de 1988. Com efeito, se no campo institucional faz sentido dizer que o Ministério Público é uno, na medida em que seus procuradores e promotores integram um só órgão, sob a direção de um só chefe, no campo do processo civil isso não ocorre, porque se deve observar um outro princípio: o da unidade funcional, de maneira que é plenamente possível que um membro do Ministério Público emita seu posicionamento em um processo com o qual não venha a concordar outro membro do Ministério Público, como por ror vezes, aliás, ocorre em recursos de apelação, quando o promotor de justiça em primeiro grau tenha se posicionado em face da pretensão de maneira diametralmente oposta a que o procurador de justiça terá se pronunciado em seu parecer na instância recursal. A referência do CPC/2015 à expressão “membro do Ministério Público” reflete essa correta compreensão do atual papel do Ministério Público no processo e o respeito que se deve dar à autonomia funcional de cada um dos membros do Ministério Público em suas manifestações no processo civil.

Se cotejarmos o enunciado do artigo 127 do CPC/1973 em face do que estatui o artigo 176 do CPC/2015, veremos algumas importantes modificações. Dentre elas, a que deixa de prever que é essencial à função jurisdicional do Estado a atuação do Ministério Público, e isso por uma questão lógica, porque essa atuação, sobretudo como “custos legis” ocorre apenas naquelas estritas hipóteses em que a Lei a preveja, de maneira que não haveria sentido em afirmar-se em norma legal que o Ministério Público exerce uma função essencial à jurisdição, quando isso não corresponde à verdade.

Outra importante modificação diz respeito àquilo que se refere ao Ministério Público como instituição. Se, na década de setenta,  ao tempo em que se preparava o projeto do que viria a ser tornar o CPC/1973, poder-se-ia dizer que o Ministério Público era ainda uma instituição não muito conhecida no Brasil, justificava-se que o Legislador então quisesse enfatizar certas garantias de natureza institucional, ao dizer que o Ministério Público era uma instituição permanente. Hoje, entretanto, quando a Constituição de 1988 cuida de, ela própria e com razão, regular o papel do Ministério Público não apenas em face do campo do Direito, mas mesmo da sociedade, não há mais a necessidade de um código de processo civil dizer que o Ministério Público é uma instituição permanente, quando a Constituição encarregou-se de deixar isso bastante claro.

Quanto às funções que o Ministério Público exerce no processo civil, o artigo 176 repete, quase que literalmente, aquilo que o artigo 127 do CPC/1973 previa, ao sublinhar que ao Ministério Público incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses e dos direitos sociais e individuais indisponíveis, havendo uma importante distinção que o artigo 176 trouxe ao se referir não apenas aos “direitos sociais e individuais indisponíveis”, mas também aos “interesses” juridicamente protegidos, distinção que a doutrina cuidou elaborado sobretudo depois do que havia ensinado o jurista português, MARCELLO CAETANO, quando, inicialmente nos domínios do direito privado, fixou com mão de mestre o que constitui um “interesse jurídico protegido”, distinguindo-o do conceito de direito subjetivo. Assim se pode dizer que, no CPC/2015, o papel do Ministério Público foi consideravelmente ampliado, conferindo-lhe o poder de atuar não apenas na proteção de direitos subjetivos, mas também de interesses juridicamente protegidos.

 

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