Alguns civilistas brasileiros, depois da entrada em vigor da Emenda Constitucional 66/2010, passaram a afirmar que o divórcio tornou-se, no direito positivo brasileiro,  um direito potestativo, porque o exercício desse direito, feito por um dos cônjuges, não pode sofrer legítima resistência de parte do outro, o que significa dizer, já no campo do direito processual civil, que, em se tratando de um direito potestativo, a tutela de evidência pode ser concedida, dado que o réu não pode se insurgir contra o direito potestativo ao divórcio, quando pleiteado na peça inicial.

Mas o direito ao divórcio não se transformou em um direito potestativo com a Emenda Constitucional 66/2010: ele, desde sempre, foi um direito potestativo e se mantém como tal, mais precisamente a partir do momento em que CHIOVENDA elaborou de modo mais consistente o conceito do “direito potestativo”, trazendo-o ao processo civil,  ao enfatizar que o que caracteriza esse tipo de direito subjetivo é que ele “carece completamente daquilo que é característico dos direitos a uma prestação, ou seja, precisamente a obrigação de uma pessoa de realizar uma prestação”. (“Instituições de Direito Processual”, vol. I, p. 14-15). E para exemplificar, CHIOVENDA afirma que a lei liberaliza ao cônjuge, por certos motivos, o poder de requerer a separação pessoal ou a separação de dotes, observando que o direito potestativo tende “à produção de um efeito jurídico a favor de um sujeito e a cargo de outro, o qual nada deve fazer, mas nem por isso pode esquivar-se àquele efeito, permanecendo sujeito à sua produção”.

Na raiz do direito potestativo está, portanto, a sujeição, que, diz CHIOVENDA, é um estado jurídico que dispensa o concurso da vontade do sujeito, ou qualquer atitude dele.

Pois bem, o direito ao divórcio continua a ser o que era antes da Emenda 66: um direito potestativo, porque o cônjuge-réu está sujeito à produção do efeito jurídico, quando o juiz entende que esse efeito jurídico é de produzir-se no caso em concreto. Aqui é que se deve considerar a novidade trazida com a Emenda 66, que, contudo, não modificou a natureza jurídica do direito subjetivo ao divórcio, que continua desde sempre a ser um direito potestativo, na medida em que seu núcleo está presente o estado de sujeição a um efeito jurídico pretendido.

Com efeito, a Emenda 66, ao dispor que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, não se referindo, pois, a prazo de separação,  aumentou o grau de sujeição a que está submetido o cônjuge-réu na ação de divórcio, visto que  a produção do efeito jurídico que envolve o direito ao divórcio, após a referida Emenda, passou a depender apenas da homologação do juiz da vontade firmada pelo cônjuge-autor, não mais condicionada a qualquer limitação temporal.

Isso, contudo, não autoriza concluir que a Emenda 66 terá transmudado  a natureza jurídica do direito subjetivo ao divórcio, tornando-o um direito potestativo. O direito ao divórcio sempre foi e sempre será um direito potestativo, porque em sua raiz está a sujeição.

Portanto, a Emenda Constitucional 66 não modificou a natureza jurídica do direito ao divórcio, senão que cuidou apenas de aumentar o poder de sujeição a que está exposto o cônjuge-réu na ação de divórcio, e como aumentou esse poder de sujeição, passou a permitir a concessão da tutela de evidência, considerando o que está previsto no artigo 311, inciso II, do CPC/2015.

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