Demos ontem um passo importante na compreensão e implementação prática do que significa e deve significar o princípio constitucional do devido processo legal “substancial”, pelo qual se pode e se deve analisar a racionalidade de leis formalmente aprovadas pelo Congresso Nacional, quando essas leis não passam pelo teste de racionalidade.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, declarou substancialmente inconstitucional uma lei de 2017, que havia autorizado a produção, a comercialização e o consumo de remédios que buscam inibir o apetite. Para compreender o contexto em que essa lei surge em 2017, é necessário remontar a 2011, quando a ANVISA, a agência reguladora, emitira um ato normativo proibindo a produção, a comercialização e o consumo de três remédios que funcionam como inibidores de apetite. Assim, na prática, a lei de 2017 tornava inválido e ineficaz o ato normativa da ANVISA.

Uma associação, contudo, decidiu levar a questão ao exame de controle concentrado de constitucionalidade, e o STF exerceu esse controle, declarando a inconstitucionalidade da lei de 2017.

Considerou o STF que, formalmente, a lei de 2017 era válida, mas a acoimou sob aspectos que se prendem com a racionalidade da lei, entendendo a nossa Corte Suprema que a lei, na prática, obliterava o poder da agência reguladora, na medida em que dispensava de registro na própria agência dos medicamentos em questão, como também impedia que a ANVISA exercesse seu poder de polícia de fiscalização sobre tais inibidores de apetite.

Não é comum no Brasil, não ao menos com uma frequência desejada, que, na análise de constitucionalidade de leis, avance-se a ponto de se examinar aspectos que dizem respeito à racionalidade em si da norma legal. De ordinário, limita-se esse exame a aspectos formais da lei, e quando se trata de perscrutar quanto à racionalidade da lei, não se chega a uma análise tão criteriosa como a que foi feita no julgamento de ontem, em que se decidiu que não é suficiente que o Congresso Nacional tenha formalmente legislado sobre uma matéria, para a qual dispunha de competência normativa, senão que é imperioso analisar se o que foi legislado quadro com uma racionalidade em si.

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