“Art. 88. Nos procedimentos de jurisdição voluntária, as despesas serão adiantadas pelo requerente e rateadas entre os interessados”.

Comentários: em 1952, FREDERICO MARQUES escrevia: “A impropriamente denominada jurisdição voluntária, que não é voluntária nem jurisdição, constitui função estatal de administração pública de direitos de ordem privada, que o Estado exerce, preventivamente, através de órgãos judiciários, com o fito e objetivo de constituir relações jurídicas, ou de modificar e desenvolver relações já existentes”. (“Ensaio sobre a Jurisdição Voluntária”). O artigo 88 refere-se exatamente às despesas processuais geradas em procedimentos de jurisdição voluntária, nos quais não há lide (conflito de interesses), sendo esse o aspecto que exigiu do legislador cuidasse, em regra específica, acerca das despesas processuais.

Com efeito, quando há sucumbência no processo civil, a parte sucumbente  deve arcar com o pagamento da taxa judiciária, despesas processuais e honorários de advogado, de modo que o regime dos encargos de sucumbência é centrado na lide e na aferição de quem nela sucumbiu (princípio da causalidade).  Mas como nos procedimentos de jurisdição voluntária não há lide (conflito de interesses),  outro deve ser o critério, que é aquele fixado pelo artigo 88, ao estabelecer que as despesas processuais devem ser adiantadas pelo requerente (nos procedimentos de jurisdição voluntária é mais adequado chamar de “requerente” aquele que inicia o procedimento, reservando-se o termo “autor” para a jurisdição contenciosa), de modo que, aquele que busca obter a tutela jurisdicional, deve adiantar o pagamento das despesas necessárias ao desenvolvimento do procedimento, despesas que, ao final, são rateadas entre todos os interessados. Se o Ministério Público for o requerente (artigo 720 do CPC/2015), não há adiantamento de despesas processuais, mas estas devem ser suportadas ao final por todos os interessados, conforme a sua quota-parte.

Os procedimentos de jurisdição voluntário estão regulados no CPC/2015 entre os artigos 719/770.

Importante salientar que o artigo 88 refere-se apenas a despesas processuais, porque não há condenação em honorários de advogado nos procedimentos de jurisdição voluntária. Há, uma exceção, de que trataremos ao final destes comentários.

Quanto à taxa judiciária (tributo), a União Federal e os Estados-membros possuem competência legislativa para a prever nos processos de sua competência. Pode ocorrer, pois, que, determinada lei a exclua do fato gerador desse tributo. Em São Paulo, a lei federal 11.608/2003 – a lei que regula a taxa judiciária nos processos de competência da justiça paulista – prevê, em seu artigo 1o., que incidirá a taxa judiciária nos procedimentos de jurisdição voluntária. Assim, o requerente deve recolher a taxa judiciária, mas esse valor configura despesa processual, de maneira que os demais interessados no procedimento de jurisdição voluntária reembolsarão  o requerente do que ele tiver despendido com a taxa judiciária, proporcionalmente de acordo com a quota-parte de cada um dos interessados.

CONFLITO DE INTERESSES: pode suceder que, no procedimento de jurisdição voluntária, revele-se, no curso do procedimento,  a presença de um conflito de interesses, como ocorre, com certa frequência, no procedimento de extinção de condomínio em coisa indivisível. Nessa hipótese, como observa OVÍDIO BAPTISTA, desaparecendo aquela identidade de interesses que caracteriza posição dos interessados nos procedimentos de jurisdição voluntária, não há razão para se aplicar a regra do artigo 88, dado que, existindo lide, a parte sucumbente deve arcar não apenas com as despesas processuais, mas também os honorários de advogado. A rigor, o procedimento deixa de ser de jurisdição voluntária para se transformar em um procedimento de jurisdição contenciosa, com a aplicação da regra geral de sucumbência.

 

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