Dizia o insuperável EÇA DE QUEIROZ, em uma de suas crônicas, que o melhor espetáculo para o homem será sempre o próprio homem, visto que “o interesse do Universo está todo na vida e na sua luta, na sua paixão e no seu cerimonial, no seu ideal e no seu real. O sol, nascendo por trás das Pirâmides, sobre o fulvo deserto da Líbia, forma um prodigioso cenário (…); mas todos esses espetáculos hão de ser sempre infinitamente menos interessantes que uma comédia de ciúmes, passada n’um quinto andar”.
Comprovamos ontem quão precisa e de verdade eterna é a observação do famoso romancista português. Com efeito, tivemos um desfile militar em Brasília com aparato, formando-se um grande comboio de tanques e muitos soldados, desfilando pelas ruas de nossa Capital Federal como se estivéssemos a comemorar um data cívica. Mas o que despertou a atenção geral não foi o cenário militar, seus tanques e soldados, mas sim o espetáculo que transcorria na mesma hora e na mesma Brasília, onde estavam reunidos no Congresso nacional nossos representantes, discutindo como se darão as eleições no ano que vem, do que depende a sobrevivência de nossa democracia.
Quem, em Brasília ou diante da televisão, estava assistindo ao desfile militar, comportou-se certamente como o grande DICKENS, que, viajando aos Alpes ou a Veneza, não deixava de pensar com saudade nas tristes ruas de sua Londres, “n’um rumor de fim de dia, e no prazer de surpreender as expressões de ansiedade, triunfo ou dor, nas faces do que passa, alumiados pelo gás vivo das lojas”, como observou EÇA.
Pois era ali, no Congresso Nacional, que estava a ocorrer o verdadeiro espetáculo que nos interessa como povo.