BOAVENTURA SOUSA SANTOS, conhecido sociólogo e professor, em artigo publicado no jornal “Público”, de Portugal, edição de hoje, destaca a relação direta que existe entre crises sociais e o avanço da extrema-direita, exemplificando com o que ocorreu nas décadas de 1920 e 1930.
Com efeito, diante de crises sociais intensas, como ocorreu após a Primeira Guerra Mundial, o governo vê-se obrigado a fazer concessões ao povo, criando novos direitos sociais ou implementando aqueles que antes não reconhecia como tais. Mas depois de um determinado tempo, o capital de algum maneira reage, e se trata de uma reação esperada, porque, quando aumenta o espaço dos direitos sociais, diminui automaticamente o campo de atuação dos direitos econômicos. Como dizia ISAIAH BERLIN, a liberdade tende a colidir e efetivamente colide com outros direitos, o que é comprovado no caso dos direitos sociais que, fundados todos na liberdade, encontram consistente resistência na liberdade que o capital exige para prevalecer.
Um pouco antes da pandemia, era voz frequente no Congresso Nacional e em setores da economia que era necessário mudar a Constituição de 1988, porque ela estaria com “excesso de direitos”. Com a pandemia, aquele discurso cessou, mas ele certamente ressurgirá tão logo a vida normal volte, quando então o capital lutará por retomar o espaço perdido aos direitos sociais. Surgirá nesse momento, diz BOAVENTURA SOUSA SANTOS, o fantasma de regresso da extrema-direita.
Extrema-direita que, como observa o sociólogo português no núcleo do artigo, serve-se da democracia com o único objetivo de a destruir: “Fá-lo por muitas vias. A principal é promover uma lógica de pertença, seja ela nacionalista ou racista, contra a lógica de participação que é própria da democracia”.
Felizmente, a história recente tem mostrado que, se antes o poder do capital era incontrastável, hoje os direitos sociais não se mostram mais tão tíbios na luta pela preservação do poder que conquistaram durante crises sociais. Basta ver o que ocorre com o Chile.