Ou por economia de espaço, ou pela simples razão de que se mostrariam destituídos de algum interesse, o certo é que raríssimas edições do Código de Processo Civil de 2015 trazem o texto da “Exposição de Motivos”, diversamente do que se dá com o Código Civil de 2002, em que as melhores edições dos mais autorizados comentadores fazem questão de introduzir o texto daquele Código pela “Exposição de Motivos”, talvez pelo fato de que a Exposição ao Código Civil seja da lavra de MIGUEL REALE.
Mas o fato é que as edições do Código de Processo de 2015, por exemplo, a sempiterna de THEOTÔNIO NEGRÃO, não trazem o texto da “Exposição de Motivos”, e com isso os leitores ficam sem saber o que deu origem à elaboração de um novo código de processo, que valores estão neles e não estavam no código de 1973, entre outros temas interessantíssimos e de aplicação prática.
Fica o leitor, pois, sem o conhecimento de um ponto emblemático da “Exposição de Motivos” ao CPC/2015, na parte em que busca justificar e convencer de que não se terá tirado a liberdade de convencimento do juiz, mesmo quando se o obriga a cumprir decisões jurisdicionais normativas, como no caso das teses fixadas no incidente de resolução demandas repetitivas. Vejam o que escreveu a comissão que redigiu a “Exposição de Motivos”:
“Se, por um lado, o princípio do livre convencimento motivado é garantia de julgamentos independentes e justos, e neste sentido mereceu ser prestigiado pelo novo Código, por outro, compreendido em seu mais estendido alcance, acaba por conduzir a distorções do princípio da legalidade e à própria ideia, antes mencionada, de Estado Democrático de Direito. A dispersão excessiva da jurisprudência produz intranquilidade social e descrédito do Poder Judiciário”.
E com uma redação que não prima pela clareza, senão que muito pelo contrário, acrescenta-se na “Exposição”:
“Se todos têm que agir em conformidade com a lei, ter-se-ia, ipso-facto, respeitada a isonomia. Essa relação de causalidade, todavia, fica comprometida como decorrência do desvirtuamento da liberdade que tem o juiz de decidir com base em seu entendimento sobre o sentido real da norma”.
Além de um estilo abstruso (muito inferior à qualidade estilística de um MIGUEL REALE, e por isso a importância que se costuma dar à “Exposição de Motivos” ao Código Civil), o texto usa de termos tão genéricos que a tudo poderiam se aplicados, e também a nada objetivamente. O que se deve entender, com efeito, por “relação de causalidade” quando se fala em livre convencimento do juiz. E que sentido, lógico ou semântico ou sistemático, podemos extrair da ideia de que “todos têm que agir em conformidade com a lei … respeitada a isonomia”.
Daí certamente o pouco interesse que desperte a leitura de um texto tão confuso e sem qualquer relação lógica com as ideias nele expostas – e apenas expostas, mas não desenvolvidas.
O que fica, entretanto, é a certeza de que o CPC/2015 deu ao juiz exatamente aquilo que lhe retirou: a liberdade de decidir. Pode o juiz decidir livremente, desde que não existam teses jurídicas, decisões de tribunais com força vinculativa e obrigatória. Não sei porque, lembrei-me de uma famosa frase atribuída a HENRY FORD, que dizia: “O cliente pode ter o carro da cor que quiser, contanto que seja preto”.