O leitor que conhece detalhes do caso “Dreyfus”, que parou a França no começo do século XX, recordar-se-á certamente da importância que tiveram os escritores ANATOLE FRANCE, e por meio deste, EMILE ZOLA, autor do famoso “J’acusse”, espécie de panfleto que determinou a reviravolta do caso.
Intelectuais dessa mesma envergadura, e também na França, SARTRE e BEAUVOIR com seus escritos e palestras mudavam o mundo. E o mesmo fizera HANNAH ARENDT, a famosa filósofa alemã e aluna de HEIDEGGER, com a sua obra “A Banalidade do Mal”.
Há, aliás, um interessante livro escrito por MICHAEL WINOCK em 1997, em que analisa o papel que os intelectuais exerceram no século XX.
Mas, entrado o século XXI, podemos dizer que os intelectuais exercem algum poder, são ainda influentes, como foram a seu tempo ZOLA, SARTRE, GIDE? A resposta é negativa. Hoje, não há nenhum intelectual dessa estatura.
Mas como o poder não convive com o vácuo, que tipo de personagem assumiu o lugar do intelectual?
O jornal espanhol “El Pais”, edição de Madrid de ontem, traz interessante matéria sobre um de nossos “youtubers” mais influentes, e que se utiliza de suas postagens para combater o que ele considera um produto do fascismo no Brasil. Seguido por quarenta milhões de seguidores, esse “youtuber” exerce, sem dúvida, um papel que era antes ocupado exclusivamente pelos intelectuais.
Parafraseando MACHADO DE ASSIS, que se indagava se ele havia mudado, ou mudara o Natal, podemos dizer: O que terá mudado: os intelectuais ou o mundo?
Não há dúvida de que não temos mais intelectuais do nível de ZOLA, SARTRE, ISAIAH BERLIN. Mas substitui-los por “youtubers” é que o problema.
Como escreveu ORTEGA Y GASSET no prólogo à indispensável obra “Historia de la Filosofia”, de EMILE BREHIER (sem tradução ainda para o português), em todas as épocas da história da Filosofia encontraremos algumas que podem ser qualificadas como de transição, e outras de épocas de decadência, em que algo decai, para que outras coisas possam germinar. É o que sucede com a nossa época: uma época de decadência, em que os intelectuais foram substituídos por “youtubers”, o que não significa, como adverte ORTEGA Y GASSET, que não existam ainda coisas boas em nossa era.