Instalou-se uma notória controvérsia no mundo jurídico depois que uma empresa de grande porte anunciou a intenção de lançar um programa para recrutar “trainee”, reservando todas as vagas apenas para pessoas da raça negra. Muitos juristas e operadores do Direito emitiriam apressada e irrefletidamente uma opinião unânime: há ilegalidade.

De fato, a Constituição de 1988, ao impor o princípio da igualdade,  veda que a raça possa ser um critério de discrímem.

Mas essa mesma Constituição incorpora como um princípio nuclear em sua estrutura o  da proporcionalidade, do qual tanto falamos aqui e que tem acentuada aplicação nos tribunais constitucionais europeus, embora no Brasil constitua ainda um princípio a que não se dá grande valor.

Por meio do princípio da proporcionalidade é que se pode trazer o bom senso, a razão, enfim a sabedoria para o campo da hermenêutica jurídica. Com efeito, quando se analisa uma determina norma legal, ato administrativo ou mesmo um ato do direito privado  sob o enfoque do princípio da proporcionalidade, isso concede ao operador do Direito a  possibilidade de considerar o aspecto da finalidade, e ela pode ser o aspecto mais importante a considerar em uma dada realidade material.

É nesse terreno que a sabedoria do interprete é colocada à prova. Extrair da norma constitucional algo que, em sua finalidade, atenda a valores maiores, pode ser proporcional, ainda que a medida em si possa não ser, sob outros aspectos, constitucional. E será a finalidade o que deve prevalecer em homenagem à sabedoria.

Qual finalidade quer a empresa atender com seu programa de treinamento? Muito mais que a contratação em si, a medida é obviamente simbólica, destinada a chamar a atenção ao grave problema do racismo e da discriminação por cor da pele que ainda impera entre nós. Justa essa finalidade, a medida é proporcional aos valores que ela quer alcançar. E portanto, amparada por nossa Constituição de 1988.

 

 

 

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