Prosseguindo na análise do artigo 77 do CPC/2015 –  e para a concluir -,  consideremos agora quais os deveres jurídico-legais que são impostos às partes, a seus procuradores, e àqueles que de qualquer modo participam do processo. São eles:

I – expor os fatos em juízo conforme a verdade;
II – não formular pretensão ou de apresentar defesa quando cientes de que são destituídas de fundamento;
III – não produzir provas e não praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou à defesa do direito;
IV – cumprir com exatidão as decisões jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e não criar embaraços à sua efetivação;
V – declinar, no primeiro momento que lhes couber falar nos autos, o endereço residencial ou profissional onde receberão intimações, atualizando essa informação sempre que ocorrer qualquer modificação temporária ou definitiva;
VI – não praticar inovação ilegal no estado de fato de bem ou direito litigioso.

Note-se desde logo que o dever de proceder com lealdade e boa-fé, que o CPC/1973 previa em seu artigo 14, inciso II, desapareceu do rol dos deveres jurídico-legais, o que, como já comentamos, reflete o objetivo do nosso legislador de enfraquecer, ou mesmo  abandonar a figura de um “processo ético”, para prestigiar apenas a efetividade. Tratava-se,  como destacava a doutrina, do principal dever jurídico-legal ligado à litigância de má-fé, e a sua supressão no atual Código não pode ser justificada pelo argumento de que as condutas previstas nos demais incisos do artigo 77 colmatam a ausência do dever de lealdade processual. Essas condutas de certa maneira podem, é certo,  ser abarcadas no conceito de lealdade processual, mas este, por ser mais amplo, concedia ao juiz a liberdade necessária para analisar com maior completude e segundo as circunstâncias do caso em concreto as condutas praticados no processo sob o enfoque de uma norma moral positivada, como era a do artigo 14, inciso II, do CPC/1973.

Poder-se-ia argumentar que como o artigo 5o. do CPC/2015 obriga  todo aquele que participa do processo a comportar-se de acordo com a boa-fé, a lealdade processual, malgrado não prevista como dever-jurídico legal no regime do novo código, estaria ainda a incidir em nosso Código de Processo Civil, o que não nos parece ocorrer. Sobre os conceitos de boa-fé e de lealdade não se equivalerem em seu conteúdo,  há também por se observar que o artigo 5o. veicula um princípio, e não propriamente um dever-jurídico legal, tanto assim que a boa-fé não aparece no texto do artigo 77, mas aparece  noutros dispositivos, como nos artigos 323, parágrafo 2o., e 489, parágrafo 3o,  do CPC/2015, a demonstrar que o atribuiu à boa-fé a natureza jurídica de um princípio, e não como um dever. Importante observar, nesse contexto, que como adscreve HABERMAS, o Direito positivo moderno utiliza-se de uma norma moral autônoma, a qual exige que diferenciemos entre normas, princípios explicativos e procedimentos (cf. “Direito e Moral”, p. 103, Instituto Piaget). De modo que, erigida a boa-fé como uma norma moral autônoma, ela impõe ao juiz considere a boa-fé como um princípio, e não como um dever, com todas as momentosas consequências que daí decorrem.

No mais, o CPC/2015 manteve os deveres que o nosso Código anterior fixava, a eles acrescentando o que impõe a obrigação de declinar-se o endereço residencial ou profissional em que se deva receber, e de manter atualizado esse endereço, e também o dever de não praticar inovação ilegal no estado de fato do bem ou do direito objeto do litigioso, o que no CPC/1973 (artigo 879, inciso III) caracterizava o suporte fático-jurídico para a caracterização do atentado, que naquele código ensejava a proteção por meio de ação cautelar.

Já tratamos, em comentário anterior, sobre o dever de dizer a verdade previsto no artigo 77, inciso I, de modo que remetemos o leitor àqueles comentários.

Importante observar, por fim, que o elemento subjetivo (o dolo) é conatural à figura da litigância de má-fé (embora não o seja em relação à figura do abuso de direito), de modo que em relação aos deveres fixados em todos os incisos do artigo 77, e também às hipóteses previstas no artigo 80, a comprovação do dolo é indispensável.

 

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