A Constituição de 1988 prevê, em seu artigo  37, inciso XV, que os vencimentos e subsídios pagos a servidor público são irredutíveis, ressalvadas determinadas situações previstas no artigo, caso, por exemplo, da aplicação do teto remuneratório, da incidência do imposto de renda. A questão que se deve formular é a seguinte: esse direito de matriz constitucional reconhecido ao servidor público não pode ser objeto de ponderação, quando estiver em confronto com a posição jurídica do Poder Público, havendo nesse caso de se aplicar o princípio da proporcionalidade, que a mesma Constituição de 1988 estabelece como um princípio nuclear?

Sim, respondemos. Poderá suceder, pois, que uma determinada e específica situação financeira esteja a obrigar o Poder Público a reduzir o valor da remuneração mensal dos servidores públicos, surgindo aí um conflito entre o direito do servidor público à irredutibilidade de vencimentos, e a posição jurídica da Administração, obrigada, pelas circunstâncias, a reduzir essa remuneração, fora daquelas hipóteses em que essa redução já é autorizada.

A título de hipótese, mas que em razão da pandemia torna-se algo bastante concreto, que os gastos públicos tenham chegado a um volume tão acentuado que obrigue a Administração a cortar gastos, e que isso torne necessário ou mesmo indispensável a redução na remuneração dos servidores públicos. Instalar-se-á, um conflito entre um direito subjetivo de matriz constitucional e a posição jurídica da Administração, para a solução do qual será necessário aplicar o princípio da proporcionalidade. Caberá ao Poder Judiciário, aplicando esse princípio, e ponderando acerca das circunstâncias da realidade material subjacente, decidir se deverá prevalecer, no caso em concreto, o direito subjetivo do servidor público, ou a posição jurídica da Administração.

Em uma palavra: nenhum direito subjetivo, ainda que previsto em norma constitucional, é absoluto, e por isso, entrando em conflito com outro direito ou com a posição jurídica do Poder Público, deverá ser objeto de ponderação, segundo as circunstâncias do caso em concreto.

Para finalizar, lembremos que em favor dos trabalhadores da iniciativa privada a Constituição de 1988 também prevê expressamente a garantia da irredutibilidade de salário (artigo 7o., inciso VI), e isso não obstou suportassem eles, em razão da pandemia, redução no valor de sua remuneração, a bem demonstrar que nenhum direito subjetivo é absoluto, pois que pode ser condicionado por outro direito ou pela posição jurídica da Administração e, nomeadamente, pelas circunstâncias da realidade material.

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