De há muito o processo civil tem abandonado o princípio da oralidade, cuja importância CHIOVENDA não deixava de enfatizar. Devido a um pressão imposta pela celeridade, a oralidade tornou-se quase que um nome excomungado do processo civil, como se esse princípio não pudesse harmonizar-se com aquele valor. O nosso CPC/2015 é um exemplo perfeito disso.
Mas quando se despreza a oralidade no processo civil, há um grave efeito que daí decorre. Algo de que o processualista não se dá conta, salvo aquele que tiver o costume de enxergar além do processo civil, o que somente é dado alcançar por quem tiver algum conhecimento mais consistente do que escreveram alguns dos grandes filósofos. Refiro-me, no caso, a WALTER BENJAMIM, que em seu ensaio “Sobre Alguns Temas de Baudelaire”, escreveu acerca da importância da narração:
“A narração não visa, como a informação, a comunicar o puro em si do acontencido, mas o incorpora na vida do relator, para proporcioná-lo, como experiência, aos que escutam. Assim, no narrado fica a marca do narrador, como a impressão da mão do oleiro sobre o pote de argila”.
Quando um código incentiva, ou quase que obriga o juiz, em nome da celeridade, a julgar antecipadamente toda e qualquer lide, a ver a audiência de preparação ou de instrução como atos que só fazem procrastinar a duração de um processo civil, quando uma legislação processual, como a do nosso CPC/2015, assim o faz, ela impede que a narração surja no processo civil, gerando como consequência que o juiz se dê por satisfeito apenas com a informação que o autor e o réu lhe dão acerca da lide, sem poder ter acesso a importantes dados que apenas por meio da narração poderia obter.
Há certamente processos civis para os quais o julgamento antecipado da lide é medida adequada, como aqueles em que se controverte acerca de uma questão exclusivamente jurídica. Para esses processos, basta que o juiz obtenha o conhecimento da lide pela informação que as partes lhe fornecem na peça inicial e na contestação acerca da posição jurídica que defendem.
Mas há processos civis em que a controvérsia é sobretudo de natureza fática, como, por exemplo, naqueles em que o autor busca a reparação por um dano moral ou material. Nesses processos, somente pela narração do acontecido é que o juiz poderá “incorporar”, como diz BENJAMIM, à sua convicção de julgador aquilo que escutou de viva voz do autor e do réu.
Um bom e escrupuloso juiz deve saber distinguir processos para os quais deverá considerar a mera informação, daqueles em que terá que buscar a narração do acontecido, antes de emitir a sentença. Uma boa legislação processual é aquela que exorta o juiz a saber distinguir.