Na próxima semana, publicaremos em nosso site um novo ensaio, em que tratamos da aplicação da teoria do “Desvio Produtivo do Consumidor” no direito público. Aqui, um pequeno trecho desse ensaio:

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As vicissitudes pelas quais não raro passa o consumidor, quando não se lhe fornece, em tempo e a modo e conforme o contratado, o produto ou serviço que adquiriu, colocado assim diante da necessidade de despender tempo na solução do problema, que pode perdurar até o momento em que obtém a tutela jurisdicional que obrigue o comerciante ou o fornecedor a cumprir o que contratara, essa comum situação em lides decorrentes de uma relação de consumo fez com que a doutrina brasileira engendrasse uma teoria que, nos quadrantes do regime da responsabilidade civil, deu ensejo a uma compreensão mais adequada daquela específica realidade. Assim surgiu a teoria a que se deu o abstruso nome de “teoria do desvio produtivo do consumidor”.

Segundo essa teoria, quando o consumidor tem suas expectativas frustradas devido a um tratamento inadequado ou defeituoso de parte do comerciante ou do fornecedor, e em razão dessa situação é obrigado a dedicar parte de seu tempo e de sua rotina para buscar a satisfação de seus interesses, nesse caso o tempo despendido deve ser quantificado e reparado, mesmo quando o tempo consumido não tivesse uma destinação produtiva, ou seja, ainda que esse tempo não pudesse ser qualificado como uma “mais-valia”, tal como a caracterizou o genial MARX. Para a teoria do “desvio produtivo”, basta que o consumidor tenha despendido algum tempo de suas “atribuições cotidianas” para a solução do problema, e o terá reparado.

Obviamente que, na construção da referida teoria. levou-se em conta, aliás mui adequadamente, o específico ambiente que ocorrem as relações de consumo, em que o consumidor muitas vezes tem que enfrentar o poder de organismos comerciais gigantescos, o que o legislador levou em conta quando fixou um rol de direitos ao consumidor, inclusive aqueles de natureza processual, como são aqueles de que trata o artigo 6º., inciso VIII, da Lei federal 8.078/1990 (“Código de Defesa do Consumidor”), destacando-se aí a possibilidade de o juiz, em sentença, aplicar a regra da inversão do ônus da prova.

Embora seja possível questionar se há, de fato, um objeto específico que justifique a criação de uma teoria que, a rigor, nada mais representa do que um desenvolvimento da vetusta teoria da responsabilidade civil, criada pelos romanos, o fato é que a sua aplicação tem contribuído a que o juiz, nas lides de relação de consumo, dê uma maior atenção ao fator tempo envolvido na solução do problema enfrentado pelo consumidor, quando esteja a quantificar o valor do dano suportado pelo consumidor.

O problema surge quando se pretende transportar essa mesma teoria a um ambiente que em nada é semelhante àquele em que está o consumidor, como se fosse válido reconhecer que o particular, quando em relação jurídica com o poder de império do Estado, pudesse aí ser visto como um consumidor. É o que está a suceder com alguns julgados, de diversos tribunais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, que tem feito aplicar a teoria do “desvio produtivo” no domínio no direito público.

 

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