A Constituição de 1988, ao tratar das diversas áreas de atuação do Poder Executivo, define as competências que são exclusivas da União Federal (artigo 22), bem assim aquelas que são compartilhadas entre a União Federal e os demais entes políticos (artigo 23), havendo aí o que se denomina de “competência comum”. Dentre as áreas de competência comum, está a saúde pública, conforme se verifica no artigo 23, inciso II, da CF/1988.

Então, poder-se-ia concluir que os estados-membros e os municípios, podendo legislar sobre saúde pública, teriam o poder de decretar o isolamento social e fechamento do comércio na área de seu território, como ora está a ocorrer. A essa conclusão, contudo,  chegaria aquele que descurasse de um palmar cuidado que o intérprete de qualquer norma legal deve ter: o de não realizar  uma interpretação literal e isolada da norma, sem a cotejar com o conjunto de normas em que esteja inserida.

Assim, a mesma Constituição de 1988 estabelece que, decretado o estado de defesa ou de sítio, apenas a União Federal, pelo senhor Presidente da República, é que o pode decretar, e tão somente a União Federal é que detém a competência para decretar as medidas devem ser adotadas para uma situação de excepcionalidade, como é a que deve estar caracterizada quando se decreta uma momentosa providência, como a  do estado de defesa e de sítio.

O que nos permite concluir, sem grande dificuldade, que os estados-membros e os municípios podem, sim, “cuidar da saúde pública”, legislando concorrentemente com a União Federal, desde que a matéria sob regulação não esteja abarcada dentre aquelas que estão sob o poder de uma competência exclusiva da União Federal, caso em que a competência concorrente deve ceder passo à prevalecente competência da União Federal, a qual compreende, importante observar, a de legislar sobre  “defesa territorial, defesa aeroespacial, defesa marítima, defesa civil e mobilização nacional”, como está expresso o artigo 22, inciso XXVIII, norma, aliás, que é consentânea com o sistema da Constituição de 1988, que dota a União Federal, e apenas ela, como o ente público que pode decretar o estado de defesa ou de sítio, e de adotar as medidas decorrentes ou necessárias à proteção da defesa civil, o que vem a abranger as medidas de isolamento social e do fechamento de comércio, quando essas medidas têm por fundamento jurídico-legal o combate a uma pandemia que atinja diversos estados-membros e municípios.

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