“CAPÍTULO VII
– DA RECONVENÇÃO
Art. 343. Na contestação, é lícito ao réu propor reconvenção para manifestar pretensão própria, conexa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.
§ 1º Proposta a reconvenção, o autor será intimado, na pessoa de seu advogado, para apresentar resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
§ 2º A desistência da ação ou a ocorrência de causa extintiva que impeça o exame de seu mérito não obsta ao prosseguimento do processo quanto à reconvenção.
§ 3º A reconvenção pode ser proposta contra o autor e terceiro.
§ 4º A reconvenção pode ser proposta pelo réu em litisconsórcio com terceiro.
§ 5º Se o autor for substituto processual, o reconvinte deverá afirmar ser titular de direito em face do substituído, e a reconvenção deverá ser proposta em face do autor, também na qualidade de substituto processual.
§ 6º O réu pode propor reconvenção independentemente de oferecer contestação”.
Comentários: o segundo requisito – o que exige que a reconvenção seja conexa com a ação ou com o fundamento da defesa -, merece uma análise mais profunda, porque está aqui a essência do instituto da reconvenção, cuja finalidade é a de possibilitar que, em um só processo, discutam-se, analisem-se e se decidam lides que, por manterem um vínculo, tanto melhor possam assim receber uma só decisão, com o que dois objetivos podem ser alcançados: o da economia processual e, especialmente, o da segurança jurídica.
Ao falar em “conexão”, o artigo 343 remete àquilo de que trata o artigo 55 do CPC/2015, segundo o qual devem ser consideradas “conexas” duas ou mais ações, quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir, de maneira que devam receber uma decisão conjunta, ou seja, uma decisão que abarque todas as ações conexas. O mesmo deve ocorrer no caso da reconvenção, ou seja, é conveniente, se possível, que o réu possa demandar o autor no mesmo processo em que ele, réu, é demandado, desde que exista entre a pretensão ou a defesa, objeto da reconvenção, e a pretensão formulada na ação, uma conexão. Mas o réu não está obrigado a reconvir. Trata-se de um direito subjetivo que o CPC/2015 lhe reconhece.
Conexão que, como havíamos enfatizado nos comentários ao artigo 55 do CPC/2015, significa vínculo. Esse é o aspecto que caracteriza a reconvenção: o existir um vínculo entre o que o réu está a pedir, cotejado com o que o autor pede. Lembremos daquele jogo de palavras de que doutrinadores mais antigos utilizavam-se, quando observavam que, na ação, o autor pede, enquanto o réu, na contestação, impede, ou melhor, quer impedir, e que na reconvenção o réu também pede, assumindo uma posição processual de contra-ataque. Quando se vale da reconvenção, o réu não está apenas a defender-se (fazendo-o pela contestação): está a contra-atacar por meio da reconvenção. Importante observar que o réu não está obrigado a contestar, para que queira reconvir. É o que está previsto no parágrafo 6o. do artigo 343 do CPC/2015.
A origem da reconvenção está no direito romano, mas foi no direito canônico que o instituto se aperfeiçoou. A reconvenção como o direito brasileiro a prevê é o resultado de uma longa tradição, pois, em que o direito português, italiano e francês tiveram importante influência.
Há quem diferencie “reconvenção” de “pedido contraposto”, quando, em verdade, não há nenhuma diferença substancial, senão que o pedido contraposto é uma modalidade de reconvenção, apenas com a particularidade de que o pedido que o réu formula não é por meio de uma petição específica, separada da contestação, senão que o “pedido contraposto” é assim chamado porque a pretensão que o réu formula é feita na própria contestação, tal como se dá agora com o artigo 343, o que, segundo alguns processualistas, teria feito com que o nosso direito positivo não mais previsse a reconvenção, senão que o pedido contraposto. Mas, como dito, não há entre uma e outra dessas figuras nenhuma diferença, senão que o pedido contraposto é uma espécie de reconvenção.
Reconvenção pressupõe necessariamente que exista um vínculo, uma conexão entre aquilo em que está alicerçada a pretensão do réu, ou ao “título” que fundamenta a sua defesa. A palavra “título”, que surgiu no projeto ao CPC/1973 foi então descartada por se entender que seu sentido mais próprio não se amoldaria à ideia que forma a essência da reconvenção. Assim é que no CPC/1973 se falava em “fundamento” da defesa, e não em “título”, e o CPC/2015 optou por manter aquilo que se tornou usual em nosso direito positivo. Com efeito, mais carregado de significação no processo de execução, o termo “título” parecia, e parece mesmo fora de lugar quando se trata da reconvenção.
Pode o réu se utilizar da reconvenção quando a pretensão que formula é conexa com a ação. Ou seja, há entre a causa de pedir da reconvenção e da ação uma identidade, ou essa identidade existe com relação ao pedido, tal como se dá com a conexão em geral, o que nos permite observar que essa identidade pode não ser absoluta. Assim, quando há um vínculo entre o que o réu pede na reconvenção e o que o autor pede na ação, existindo, pois, um vínculo, que pode ser de natureza puramente lógica, ou lógico-jurídica, a reconvenção deve ser admitida, ainda quando não exista uma absoluta identidade entre a causa de pedir e o pedido de uma e de outra. O fato de a pretensão formulada na ação e na reconvenção radicar em uma mesma relação jurídica é elemento indicativo de que a reconvenção deva ser admitida.
No caso da conexão com base no fundamento da defesa, CHIOVENDA sustentava que essa conexão somente existe quando se trata de compensação. O nosso direito positivo, contudo, não exclui exista a conexão entre o fundamento da defesa e o da ação noutras situações, para além da compensação.
RECONVENÇÃO DA RECONVENÇÃO. Havia, e ainda há discussão na doutrina acerca da possibilidade de o autor, demandado pelo réu por meio da reconvenção, também poder reconvir, instalando-se, assim, uma reconvenção da reconvenção. Hoje, a posição que prevalece, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, é no sentido de que se a deva admitir.
PROCEDIMENTO: a reconvenção deve ser veiculada na contestação. O autor (que a práxis costuma denominar como “autor-reconvindo”) é intimado, na pessoa de seu advogado, para apresentar resposta à reconvenção. O rito adotado à ação não pode ser tão específico a ponto de não permitir, por causa de suas especificidades, o processamento da reconvenção. O mesmo se há dizer do procedimento da reconvenção. Mas, não havendo nada que o contraindique, o réu pode abrir mão do rito especial, para que a sua pretensão seja examinada sob o rito comum, se esse é o rito sob o qual se processa a ação.
Por fim, há que se observar que, com a reconvenção, o processo sofre influxo direto decorrente da cumulação de pretensões. Ou seja, o CPC/2015 torna ainda mais evidente a ideia de que o processo não é da propriedade do autor, senão que dele fazem parte tanto o autor, quanto o réu (e também o juiz, por óbvio). Isso significa que, extinta anormalmente a ação que o autor formulou (por meio da desistência, por exemplo), o processo deve continuar para que o juiz examine então a reconvenção.