Os jornais nos deram a conhecer que um ministro de nossa Corte Suprema, submetendo-se a concurso para professor titular de uma prestigiada universidade brasileira, apresentou tese com o título algo pomposo de “Direito eleitoral e o novo populismo digital extremista: liberdade de escolha do eleitor e a promoção da democracia”. Foi aprovado com louvor por uma banca formada por um professor de direito processual civil, um professor de filosofia do Direito, uma professora de ciência política, e dois professores de direito constitucional, um deles estrangeiro. Segundo os jornais, o candidato foi aprovado com louvor.
O que logo chama a atenção é o fato de não ter havido nenhum integrante na banca da área da sociologia geral, o que seria de se esperar em virtude de o candidato, avançando para além dos domínios do direito, escrever sobre conceitos engendrados de há muito na sociologia e ali bastante discutidos, como é o conceito de “patriarcado”, de que com grande domínio falava RAYMUNDO FAORO em sua obra “Os Donos do Poder – Formação do Patronado Político Brasileiro”, que, além de jurista, foi sociólogo e historiador. Antes dele, outro sociólogo, um dos mais importantes sociólogos brasileiros, GILBERTO FREYRE interpretara as relações do poder no Brasil, encarando-as sob a ideia de como o patronado se formou entre nós e que papel teve, inclusive nas eleições.
O tema, como se vê, vai muito além do Direito, ou mais propriamente termina nele, na medida em que, como uma superestrutura ideológica, é o direito (neste caso o direito positivo) que regula no plano legal como as eleições devem ser realizadas e quais os limites de controle de poder que se podem aplicar, de maneira que a ação do patronado possa ser de algum modo controlado, com a ressalva de que, como toda superestrutura, o direito positivo também deve ser encarado sob a ideia de que é um instrumento ideológico, ou seja, ligado diretamente ao poder e aos grupos que o exercem.
Estivesse a banca formada por sociólogos, e seria deveras interessante como eles pensariam sobre a consistência do conceito que o candidato adotou em sua defesa de tese, o do “patriarcado branco”, o que certamente os levaria a refletir mais de perto sobre qual é o papel do direito positivo na mantença desse fenômeno brasileiro que desde sempre existe, criado bem antes da era digital.