“Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar:
I – enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV – enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.
§ 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição.
§ 2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 241.
§ 3º Interposta a apelação, o juiz poderá retratar-se em 5 (cinco) dias.
§ 4º Se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com a citação do réu, e, se não houver retratação, determinará a citação do réu para apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias”.
Comentários: comecemos por observar o contrassenso em que incide o Legislador, porque se a lide objeto do processo amolda-se a qualquer das hipóteses previstas nos incisos I a IV do artigo 332 do CPC/2015, é evidente que não há a necessidade de ter lugar a fase de instrução, pela simples e óbvia razão de que os referidos incisos se referem a casos que versam apenas sobre matérias exclusivamente jurídicas, e que por esse motivo é que deram azo a enunciados, súmulas ou teses fixadas por tribunais e superposição (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça) ou tribunais locais. Não é que o juiz possa dispensar a fase de instrução: essa fase é de todo desnecessária, porque não há controvérsia fática envolvendo a lide.
Mas há ainda um outro contrassenso, na medida em que o artigo 332 autoriza que o juiz declare improcedente o pedido, quando este contraria súmulas vinculantes, teses jurídicas e enunciados, mas não permite que o juiz, diante da mesma situação, declare desde logo como procedente, quando o pedido ajusta-se perfeitamente àquilo que dizem essas mesmas súmulas, teses e enunciados. Não há razão lógica, pois, para permitir que o juiz possa declarar a imediata improcedência ao pedido, mas que não possa o declarar procedente, quando se trata de uma idêntica situação jurídico-processual.
Se compararmos o artigo 332 do CPC/2015 com o artigo 285-A do CPC/1973, veremos que, no novel código, ampliou-se consideravelmente o número de hipóteses em que ocorre o julgamento imediato do mérito da pretensão, quando sequer tenha havido a citação, em um arremedo, pois, de processo, tornado uma ficção, como se não houvesse lide. Alguns processualistas entendem que o artigo 332 do CPC/2015 buscou superar uma “falta de técnica” que envolvia o artigo 285-A do CPC/1973, que falava em “dispensa da citação”, quando a citação não pode ser dispensada em função do que exige o princípio do devido processo legal. Mas não se trata de “falta de técnica”, senão que de uma situação que desatende ao princípio do devido processo legal, na medida em que à ideia de um processo justo é imanente a garantia ao contraditório, e isso obviamente exige um processo em que o réu tenha sido citado, e que o tenha sido previamente à sentença. Destarte, a mesma inconstitucionalidade que estava presente ao tempo em que o artigo 285-A do CPC/1973 vigia, caracteriza-se em face do artigo 332 do CPC/2015, ainda que este dispositivo não fale mais em “dispensa da citação”.
Essa inconstitucionalidade é ainda reforçada pelo fato de o artigo 332 do CPC/2015 impor ao juiz proceda ao imediato julgamento de mérito da demanda, diversamente do que ocorria em face do artigo 285-A do CPC/2015, cujo enunciado era interpretado no sentido de que se tratava de uma providência deixada ao alvedrio do juiz. De todo o modo, ainda que se trate de uma norma impositiva, o artigo 332 do CPC/2015 não suprime do juiz o poder de, incidentalmente, declarar a inconstitucionalidade da própria norma do artigo 332, para não a aplicar em um caso em concreto.