Raras, raríssimas são as ocasiões em que um estudo acadêmico trai à consciência de quem organiza, dirige e executa um estudo dessa natureza, revelando algo insólito. É o que ocorreu com o estudo realizado por uma importante federação do comércio e que tem por objetivo estudar as consequências daquilo que esse mesmo estudo denomina de “ativismo judicial na área trabalhista”, um fenômeno que, segundo esse estudo acadêmico, está a produzir uma sensível insegurança jurídica, causando consideráveis prejuízos financeiros às empresas.
Pois bem, o sociólogo e professor que coordenou tal estudo acadêmico, entrevistado por um grande jornal paulista, respondendo às questões sobre os resultados obtidos com a pesquisa acadêmica, lá pelas tantas disse textualmente o seguinte, quando indagado se a insegurança jurídica no Brasil está a aumentar:
“Aumentou bastante porque há uma oscilação muito grande na composição dos tribunais, à medida que vão se tornando mais ecléticos e os juízes, mais ideológicos. É um sinal dos tempos. O identitarismo está crescendo muito em todas as áreas. É a busca de mais diversidade, mais justiça social, e isso influenciou os juízes. Essa ideologia social está fazendo com que o Judiciário esteja se tornando muito imaginativo na hora de decidir”.
Não poderia o entrevistado e organizador do estudo acadêmico ser mais claro: para ele, na base desse “ativismo judicial” está a diversidade que hoje foi alcançada no ingresso à Magistratura trabalhista, que, dentre as justiças brasileiras, é certamente aquela sempre mais aberta aos ventos modernos, inclusive nos critérios de recrutamento de seus juízes, provindos das mais diversas classes sociais, fenômeno que, aos poucos, mas com consistência têm sido observado na justiça estadual.
Para o ilustre professor, o Judiciário está mais “imaginativo” na exata medida em que juízes de origem social menos favorecida estão a chegar aos postos da Justiça do Trabalho, e isso é que está a tornar essa justiça mais “criativa”, o que seria prejudicial à segurança jurídica. Melhor certamente seria o tempo em que a Justiça era, digamos, “chapa-branca”, formada por pessoas que provinham apenas de classes mais abastadas, filhos em grande maioria de empresários, que tendiam naturalmente a proteger os interesses daqueles que lhes eram mais próximos (!).
Agora, que a Justiça do Trabalho tem alcançado uma oxigenação maior, que os juízes provêm de realidades sociais e econômicas as mais distintas, como é próprio de ocorrer no Brasil, as críticas ao que se chama de “justiça social” surgem, mas vindas daqueles que querem que o Juiz pense apenas dentro de um espaço muito pequeno, em que a sua liberdade, se existir, possa ser empregada exclusivamente para manter os poderosos no poder.
Por revelar de modo inusitado e tão claro como pensa uma parte da elite acadêmica do Brasil, essa entrevista é de fundamental importância, a ponto mesmo de merecer, ela própria, um estudo mais aprofundado.