“CAPÍTULO II
– DO PROCEDIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA REQUERIDA EM CARÁTER ANTECEDENTE
Art. 303. Nos casos em que a urgência for contemporânea à propositura da ação, a petição inicial pode limitar-se ao requerimento da tutela antecipada e à indicação do pedido de tutela final, com a exposição da lide, do direito que se busca realizar e do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Concedida a tutela antecipada a que se refere o caput deste artigo:
I – o autor deverá aditar a petição inicial, com a complementação de sua argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final, em 15 (quinze) dias ou em outro prazo maior que o juiz fixar;
II – o réu será citado e intimado para a audiência de conciliação ou de mediação na forma do art. 334;
III – não havendo autocomposição, o prazo para contestação será contado na forma do art. 335.
§ 2º Não realizado o aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito.
§ 3º O aditamento a que se refere o inciso I do § 1º deste artigo dar-se-á nos mesmos autos, sem incidência de novas custas processuais.
§ 4º Na petição inicial a que se refere o caput deste artigo, o autor terá de indicar o valor da causa, que deve levar em consideração o pedido de tutela final.
§ 5º O autor indicará na petição inicial, ainda, que pretende valer-se do benefício previsto no caput deste artigo.
§ 6º Caso entenda que não há elementos para a concessão de tutela antecipada, o órgão jurisdicional determinará a emenda da petição inicial em até 5 (cinco) dias, sob pena de ser indeferida e de o processo ser extinto sem resolução de mérito”.

Comentários: no CPC/1973, tínhamos o processo cautelar autônomo, engendrado pela doutrina e jurisprudência como um tipo de processo destinado a proteger a eficácia de um processo considerado principal, em face do qual o processo cautelar seria uma espécie de “processo acessório”. Enquanto no processo principal, cabia ao juiz declarar se o direito subjetivo alegado pelo autor existiria ou não, no processo cautelar o juiz deveria se limitar a conferir  proteção jurídica necessária a que o provimento jurisdicional a ser emitido no processo principal pudesse ser eficaz, ao tempo em que viesse a ser concedido, e na hipótese de o direito subjetivo alegado pelo autor realmente existir.

O CPC/2015 abandonou a ideia de um processo cautelar autônomo. Em lugar dele, passam a existir as tutelas provisórias de urgência, que  não são “processos”, mas técnicas ideadas com a finalidade de substituir o processo cautelar naquela precisa finalidade: a de assegurar que a tutela jurisdicional possa ser revelar útil ao tempo em que vier a ser concedida, quando então aquilo que fora antes concedido como uma tutela provisória de urgência, passa a compor o provimento jurisdicional definitivo.

Há situações criadas pela realidade que fazem criar um risco concreto, impondo ao autor  ou busque obter imediatamente a tutela jurisdicional, ou verá seu suposto direito subjetivo perecer, não no plano jurídico, que para esse plano quase nada há que o Direito não possa remediar, porque o Direito opera com ficções, ele próprio sendo uma ficção. É equivocado dizer, portanto, que há situações jurídicas irreversíveis. O que há são situações fáticas irreversíveis.

Substituindo o processo cautelar, as técnicas que envolvem a tutela provisória de urgência têm por objetivo controlar uma situação de risco que pode existir antes mesmo de a lide conformar-se em seus principais aspectos, o que poderia ensejar, no plano lógico, a conclusão de que haveria então uma lide “cautelar”, formada pelo risco, e uma lide “principal”, em face da qual o juiz deve analisar se existe ou não o direito subjetivo alegado. Aliás, ao tempo em que vigia o CPC/1973, uma parte da doutrina brasileira entendia que havia “mérito” no processo cautelar, no sentido de que o autor estava a invocar o direito de proteção em face de uma situação de risco e que por isso se lhe deveria reconhecer o respectivo direito processual.

Mas há situações para as quais o controle de uma situação de risco vai além desse próprio controle, porque, a compasso com o pedir o autor tal proteção, pretende também que o direito subjetivo em si, ou parte dele, seja imediatamente implementada no e pelo processo. Trata-se do que o CPC/2015 denomina de “tutela antecipada”, que também é uma técnica processual centrada na urgência. É dessa técnica que o artigo 301 cuida.

Importante observar que o enunciado normativo do artigo 303 fala em “procedimento” e não em ação, o que é bastante emblemático, visto que o Legislador não está a dizer que exista uma “ação”, senão que apenas um procedimento, ou seja, um rito pelo qual o autor deve passar até que possa ajuizar efetivamente a ação, na qual controverterá quanto ao direito subjetivo em si, depois de ter obtido a proteção à situação de risco, e mais do que essa proteção, a antecipação de efeitos que envolvem o direito subjetivo.

Acerca da situação de risco, devemos observar a impropriedade lógico-jurídica do que diz o enunciado do artigo 303, quando se refere a uma situação de urgência  “contemporânea à propositura da ação”. Com efeito, essa relação de tempo não é aferida em relação ao momento em que a ação poderia ser ajuizada, senão com relação ao momento em que o risco, ele próprio, está presente. Ou seja, esse risco pode se caracterizar muito tempo antes de a lide configurar-se, o que enseja que o autor se valha da tutela preventiva, que é uma forma de tutela provisória de urgência.

Mas o artigo 303 está a tratar de uma outra situação: a daquela em que existe o risco, que surge ao tempo em que a lide está está conformada, ou ao menos conformada em seus aspectos substanciais, de modo que o autor, utilizando-se da técnica das tutelas provisórias de urgência, pede ao juiz que, antes mesmo do processo, em um procedimento prévio, conceda-se-lhe a tutela antecipada, com o que efeitos que, em condições normais, surgiriam apenas no momento em que o provimento jurisdicional fosse concedido, esses efeitos poderão se produzidos, porque uma situação de risco concreto exige que assim ocorra.

 

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