Demora, mas a conta chega. É o que está a ocorrer com o CPC/2015, que assumiu o risco de ter deixado de lado o valor de um processo ético, que no CPC/1973 era o valor nuclear, conforme enfatizava ALFREDO BUZAID na Exposição de Motivos àquele Código. A preocupação do CPC/2015 é marcadamente com a efetividade da tutela jurisdicional, sem demonstrar uma consistente preocupação com o processo ético, e com isso contribui diretamente para o surgimento da “litigância predatória”, que é um fenômeno que tem poucos anos no Brasil e que coincide precisamente com o momento em que o CPC/2015 começa a conviver com os fantasmas que ele mesmo criou.

Com efeito, em lugar de aperfeiçoar o instituto da litigância de má-fé, utilizando-se da experiência colhida durante o longo tempo em que esteve em vigor o CPC/1973, o Legislador fez uma escolha errada ao se preocupar apenas com a efetividade. E o mote da efetividade é que construiu o terreno propício a que alguns advogados vissem no processo civil um meio fácil de ganharem dinheiro com ações fictícias, porque os fatos alegados na causa de pedir não existem, ou se existem, não existem como a peça inicial os descreve, buscando induzir o juiz a erro.

Em muitas dessas ações, sequer o autor sabe que está a demandar. “Litigância predatória” é o nome que se convencionou dar a esse fenômeno, que, curiosamente, fez antecipar no processo civil a chegada de um outro fenômeno, de maior escala, que é o fenômeno da inteligência artificial. Mas em vez de um computador inventar uma história, é o advogado que o faz.

A edição de hoje do jornal “Valor Econômico” traz matérias sobre os significativos prejuízos que o fenômeno da “litigância predatória” está a produzir, seja na movimentação da máquina judiciária, seja no custo que as empresas têm que arcar com as defesas nos processos judiciais. Um setor em especial que tem convivido com esse grave problema é o das construtoras que tomaram recursos financeiros junto à Caixa Econômica Federal para a realização de obras que envolvem um programa social de habitação. De 2018 a 2022, informa o jornal, foram 76,1 mil processos ajuizados contra a Caixa Econômica Federal, demandada para responder por vícios na construção de imóveis, e na grande maioria desses processos se configura a “litigância predatória”.

Em pretendendo que houvesse um processo apenas efetivo, e não ético, o CPC/2015 deu causa a esse fenômeno. É, a conta chegou.

 

 

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