Interessantíssimo, e de grande utilidade para nós brasileiros, o artigo escrito pelo cronista português, JOÃO MIGUEL TAVARES, em sua habitual coluna no jornal “O Público”, edição de Lisboa, publicado hoje. O título é emblemático: “Grandes escritórios a escrever leis? Acabem com isso de vez”.
Trata-se de curioso episódio ocorrido em Portugal, mas que se repete no Brasil com maior constância. Grupos econômicos poderosos oferecem seus valiosos préstimos, e sua experiência com dinheiro, para fazerem um trabalho “gratuito” de consultoria, ajudando o Legislador a elaborar leis que, por serem muito técnicas, necessitam desse apoio, digamos intelectual.
Em Portugal, diz JOÃO MIGUEL TAVARES, um antigo secretário de Estado, e hoje sócio de uma sociedade de advogados, assumiu “de forma integralmente gratuita” a coordenação de um grupo de trabalho que supeditará o Legislador na elaboração de uma lei de interesse da indústria. Daí a justa observação do cronista português: “O caso mostra bem o quão perniciosa é esta ideia de atribuir a grandes escritórios de advogados a tarefa de construir leis que deveriam da exclusiva responsabilidade do Governo e do Parlamento. Uma coisa é o Estado procurar apoio técnico muito especializado, junto de escritórios privados, num ponto ou outro de um diploma. Outra coisa, totalmente diferente, é entregar a coordenação de legislação desta importância a um sócio da sociedade (…)”.
Aqui no Brasil há uma importante diferença. É que contratações como essa não existem oficialmente. Os grupos econômicos contratam ex-deputados, ex-ministros de tribunais superiores como consultores, delegando a eles a tarefa de intercederem junto aos Poderes competentes, para que os interesses desses grupos econômicos prevaleçam e se tornem lei ou jurisprudência. Vemos agora um ex-deputado federal e ex-presidente da Câmara Federal presidindo uma associação composta por instituições financeiras e reclamando da reforma tributária.
Portugal é, oficialmente, um país socialista, enquanto o Brasil é um país liberal. Talvez aí esteja a diferença, porque aqui o Legislador, ele próprio, continua a escrever as leis, ainda que às escondidas ajudado por grupos de pressão. Em Portugal, o Legislador socializa esse árduo trabalho.