O cidadão comum, que não possua formação jurídica, leitor habitual de jornais, estará a constatar, perplexo, como o Direito é variável: casos que haviam sido julgados de um jeito, tiveram depois uma decisão diametralmente oposta, ou seja, aqueles que haviam sido condenados, foram depois absolvidos. E o cidadão comum, estupefato, considerará que o Direito não é nada fixo, e dará razão a MACHADO DE ASSIS quando observa, em “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, que não lhe ocorria nada que fosse assaz fixo no mundo, salvo talvez a lua, as pirâmides do Egito, e quem sabe a finada dieta germânica. O Direito, notará o perspicaz leitor, MACHADO não o inseriu dentre as coisas fixas do mundo.
E de fato o Direito não pode ser fixo pela simples razão de que o Direito é o que é, e porque, como observa RAFAELLE DE GIORGI, “pode ser distinto, não existem outras possibilidades de determinar a consistência das operações, senão em relação ao tipo de consistência que é determinada pelo sistema do direito. Em outros termos, o sistema considera sua racionalidade como a qualidade das operações, que reforçam sua diferença em relação ao ambiente, e o direito (…) é um sistema operativamente fechado”. (Direito, Democracia e Risco – Vínculos com o Futuro).
Isso já o havia percebido e dito NIKLAS LUHMANN, quando afirma que o Direito opera com expectativas de expectativas, o que é suficiente para demonstrar que a continência está na raiz do Direito, formando como uma sua natureza menos evidente ao cidadão comum, havendo aí, aliás, um arcano que os juristas não gostam que o cidadão comum o tenha revelado, porque interessa ao Direito a ideia de que ele é objetivo e preciso, e não variável.
É próprio das expectativas o poderem ser frustradas, tantas são as variantes que a Realidade impõe, sobretudo ao Direito. Circunstâncias, porque são cambiantes, podem tudo mudar, e o Direito sabe que deve operar com a possibilidade de que aquilo que é agora, pode não ser mais daqui a pouco.
CALAMANDREI já havia lobrigado essa contingência quando escreveu seu famoso livro “Eles, os Juízes, vistos por um Advogado”, quando se refere a um episódio de sua vida de advogado quando, em um tribunal italiano, sentado ao lado de seu cliente e aguardando que uma das várias portas se abrisse, e ali tivesse o julgamento de sua causa, compreendeu naquele preciso momento que cada porta daquelas nada mais era do que as contingências com as quais o Direito necessariamente lida.