Aos poucos e com considerável atraso a doutrina e a jurisprudência brasileira vão se dando conta de que o princípio da proporcionalidade, incorporado à nossa Constituição de 1988, não é algo meramente simbólico ou que se aplica apenas às relações jurídicas de que faça parte o Estado. Os civilistas e comercialistas começam a perceber que também no Direito Civil e no Direito Empresarial esse princípio tem e deve ter aplicação.
É o que explica a recente guinada na jurisprudência no Direito Societário acerca do conteúdo e alcance do artigo 1.085 do Código Civil, cujo enunciado é o seguinte:
“Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.
Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa”.
O conceito de “justa causa”, utilizado pelo Legislador para justificar a exclusão de um sócio minoritário, durante muito tempo foi construído sem que o intérprete da norma legal do artigo 1.085 olhasse para fora de sua moldura. E já que falamos em moldura, podemos dizer que o quadrou mudou. O conceito de “justa causa” passou a ser perscrutado também em relação àquelas formas de controle que estão enfeixadas no princípio da proporcionalidade, a dizer: o controle quanto ao meio, quanto à finalidade, quanto ao equilíbrio entre meio e fim, e sobretudo quanto a uma ponderação entre os interesses em conflito.
O lembrar que existe o princípio da proporcionalidade e que se o deve aplicar também às relações jurídico-privadas é que deu azo a que se interpretasse o conceito de “justa causa” com uma detida análise nas circunstâncias do caso em concreto, com o perscrutar sobre as razões e motivos que a sociedade terá tido para excluir um sócio minoritário, apurando-se se há ou não gravidade no fato que deu causa à exclusão do sócio, em um contexto fático-jurídico, portanto, que é próprio à aplicação do princípio da proporcionalidade.
A propósito, o princípio da proporcionalidade tem feito tanto bem aos civilistas em geral que os está a obrigar a explicitar o que forma um conteúdo jurídico indeterminado. Não basta mais dizer-se que algo contraria à “boa-fé objetiva”, aos “bons costumes”, que existe uma “justa causa”. Os fatos extraídos da relação material subjacente devem preencher esses conceitos indeterminados.