Demorou, mais chegou a hora. A realidade a impôs. Refiro-me ao momento atual, em que a nossa Corte Suprema cuidará decidir nos próximos dias se empresas estatais possuem ou não cargos públicos, e em existindo cargos dessa natureza, podem ser ocupados por pessoas que tenham atuado, nos últimos três anos, em partidos políticos ou campanhas eleitorais.
A solução dessas questões jurídicas passa necessariamente pela definição do conteúdo de dois princípios constitucionais: os da impessoalidade e eficiência. Como a nossa Corte Suprema os considera, define-os e os fará aplicados, é o que se tratará de fazer na referida ação. O resultado desse julgamento, no entanto, ultrapassa em muito os limites dessa ação, tendo em conta que a definição de conteúdo de princípios constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal tende a vincular os tribunais inferiores, mesmo quando o efeito vinculante não é fixado.
Uma empresa estatal, importante observar, não é o Estado. O Estado é apenas seu proprietário. Aliás, a denominação “empresa estatal” é bastante feliz. Trata-se, em essência e na prática, de uma empresa, e, assim, de um mecanismo engendrado há muito tempo como uma forma de o Estado intervir de algum modo na economia, produzindo riqueza em um regime de livre concorrência. O interesse público deve estar presente, como o deve estar em tudo em que o Estado esteja presente, mesmo quando o faça indiretamente, como se dá por meio das empresas estatais.
Destarte, os cargos que estruturam uma empresa estatal não são cargos políticos. São cargos técnicos, que devem ser ocupados por técnicos, o que não obsta, contudo, que possam ser “políticos-técnicos”, ou seja, pessoas que, a compasso com o domínio da técnica que é de interesse da empresa estatal, exerçam atividade política, mas uma atividade política geral, não vinculada diretamente a partidos. Daí a exigência, que consta de lei formal e substancialmente válida, de que os indicados a cargos da estrutura da empresa estatal não possam ter tido, nos últimos três anos, vínculos com partidos políticos.
Em linhas gerais, o princípio da impessoalidade consiste na obrigação imposta ao Estado de não fazer distinções com base na pessoa envolvida, senão que o Estado deve analisar de modo objetivo a situação com a qual se depara, não podendo o Administrador Público, por exemplo, nomear seu cônjuge, companheiro, ou parente, conforme a súmula vinculante 13, a qual extraiu um conteúdo, embora apenas parcial, do princípio da impessoalidade, porque a rigor a impessoalidade deve ser considerada de modo mais amplo, abrangendo todas as situações nas quais se obrigue o Estado a agir com base em critérios objetivos, o que, aliás, deve ser harmonizar com o princípio da eficiência.
Princípio da eficiência que tem importância significativa no caso das empresas estatais e dos cargos de direção que as estruturam, donde a necessidade de que a capacidade técnica seja o fator primordial a ser objetivamente considerado na nomeação.
Como enfatiza o conhecido juspublicista alemão, ROBERT ALEXY, os princípios constitucionais são mandamentos de otimização, e como tais devem ter seu conteúdo, e também seu alcance, extraídos e definidos pela realidade material subjacente. O que no caso em questão significa dever levar em conta a finalidade para a qual a lei vedou a nomeação de pessoas que tenham vínculo com os partidos políticos, uma eficiente forma pela qual o Legislador infraconstitucional buscou dar adequada e justa proporção aos princípios da impessoalidade e da eficiência.