“CAPÍTULO II
– DOS IMPEDIMENTOS E DA SUSPEIÇÃO
Art. 144. Há impedimento do juiz, sendo-lhe vedado exercer suas funções no processo:
I – em que interveio como mandatário da parte, oficiou como perito, funcionou como membro do Ministério Público ou prestou depoimento como testemunha;
II – de que conheceu em outro grau de jurisdição, tendo proferido decisão;
III – quando nele estiver postulando, como defensor público, advogado ou membro do Ministério Público, seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
IV – quando for parte no processo ele próprio, seu cônjuge ou companheiro, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive;
V – quando for sócio ou membro de direção ou de administração de pessoa jurídica parte no processo;
VI – quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de qualquer das partes;
VII – em que figure como parte instituição de ensino com a qual tenha relação de emprego ou decorrente de contrato de prestação de serviços;
VIII – em que figure como parte cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de outro escritório;
IX – quando promover ação contra a parte ou seu advogado.
§ 1º Na hipótese do inciso III, o impedimento só se verifica quando o defensor público, o advogado ou o membro do Ministério Público já integrava o processo antes do início da atividade judicante do juiz.
§ 2º É vedada a criação de fato superveniente a fim de caracterizar impedimento do juiz.
§ 3º O impedimento previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus quadros advogado que individualmente ostente a condição nele prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo”.
Comentários: revela-se evidente a grande preocupação do CPC/2015, ampliando consideravelmente o elenco das hipóteses em que se configura o impedimento e a suspeição do juiz, com a ideia de que a garantia a um processo justo projete seus efeitos também quanto à necessidade de que o processo seja conduzido por um juiz equidistante das partes e que não tenha ou possa ter qualquer vínculo, mesmo indireto, com elas. As hipóteses que o artigo 144 do CPC/2015 traz abarcam uma série de situações em que esse vínculo pode estar presente, o que é motivo por si só suficiente para que o processo passe a um outro juiz, configurando-se o impedimento.
Se compararmos o elenco do artigo 144 com o do artigo 134 do CPC/1973, veremos que essas hipóteses foram bastante alargadas, o que atende ao princípio do devido processo legal, em cujo conteúdo está a garantia a um processo justo. E um processo justo não é apenas um processo que dê uma solução justa à lide, mas que seja conduzido por um juiz sobre o qual não recaia qualquer situação que caracterize impedimento, nem suspeição, vícios que afetam potencialmente o predicado da imparcialidade do julgador.
Há que se distinguir “impedimento” de “suspeição”, como faz PONTES DE MIRANDA: “Posto que sistemas jurídicos encambulhem os dois conceitos, ser impedido não é o mesmo que ser suspeito. Quem está sob suspeição está em situação de dúvida quanto ao seu bom procedimento. Quem está impedido está fora de dúvida, pela enorme possibilidade de ter influência maléfica para a sua função”. (“Comentários ao Código de Processo Civil”, tomo II, p. 399, editora Forense).
É da tradição de nosso código de processo civil distinguir as hipóteses de impedimento e de suspeição. Fazia-o o CPC/1973 (artigos 134 e 135), e o CPC/2015 tratou de manter essa tradição, ao cuidar das hipóteses de impedimento no artigo 144, e as de suspeição no artigo 145, sendo importante ressaltar que o CPC/2015 expressamente trata do impedimento, chamando-o como tal, ao contrário do que se dava no CPC/1973, em que o artigo 134 não se referia expressamente ao impedimento, mas apenas à suspeição.
As hipóteses de impedimento do juiz são aquelas em que, aos olhos da Lei, não há dúvida de que o juiz mantém um vínculo significativo com as partes do processo, e será tanto melhor que não possa conduzir esse processo. Essas hipóteses estão previstas no artigo 144 e, conforme sublinhado, são mais amplas do que aquelas que estavam previstas no CPC/1973.
Com efeito, enquanto no CPC/1973 o juiz estava ou deveria estar impedido se fosse parte (artigo 134, inciso I), no CPC/2015 as situações são muito mais abrangentes, alcançando não apenas essa condição formal de parte, senão que também as hipóteses em que seu cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau inclusive, seja a parte, além de outras situações como aquelas em que o juiz tiver sido mandatário da parte, atuado como perito, como membro do Ministério Público, ou mesmo tiver prestado depoimento como testemunha.
Outra hipótese criada pelo CPC/2015, artigo 144, inciso VIII, demonstra como o Legislador aumentou consideravelmente o espectro de situações em que o impedimento do juiz configura-se, como no caso em que figure como parte do processo um cliente do escritório de advocacia do cônjuge, companheiro ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, do juiz, mesmo na hipótese em que a ação na esteja a atuar um advogado de outro escritório.
Com o objetivo de regular a situação em que se tenha criado artificialmente uma situação que pode caracterizar o impedimento, o parágrafo 2o. do artigo 144, preservando o juiz natural, prevê que o impedimento não será reconhecido, além de a hipótese poder ser considerada como litigância de má-fé. Conquanto a redação desse dispositivo seja imperfeita, ao dizer que se veda a criação de um fato superveniente, quando não se pode vedar o que já estará criado (o fato que conduziria ao impedimento), senão que se pode apenas regular apenas seus efeitos, é de se considerar que esse efeito no caso previsto pela norma conduz à desconsideração do impedimento, mantendo-se o juiz na condução do processo, a tornar ineficaz, portanto, o efeito pretendido pelo fato artificialmente criado.