“Art. 137. Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente”.
Comentários: cuidou o CPC/2015, por seu artigo 137, de tomar evidente posição em face da momentosa questão doutrinária sobre os efeitos da decisão que acolhe o pedido de desconsideração da personalidade jurídica. Na doutrina, há com efeito, quem sustente que a desconsideração somente pode produzir limitados efeitos processuais. O artigo 137 não acolhe essa posição, ao estatuir que, acolhido o pedido, a desconsideração traz consigo o efeito de tornar ineficaz no plano das relações jurídico-materiais o ato que, consubstanciado em alienação ou oneração de bens, caracterize-se como fraude de execução, de modo que, conquanto seja válido esse ato, ele será de todo ineficaz em relação ao requerente do pedido de desconsideração da personalidade jurídica.
É sobre no plano das relações jurídico-materiais que está a importância da distinção entre validez e eficácia dos atos jurídicos, teoria que, engendrada nos domínios do Direito Civil, ali alcançou um considerável grau de profundidade, estendendo seus efeitos também ao processo civil, quando se trata de considerar, por exemplo, a validez de um ato processual, suprimindo-lhe, contudo, a eficácia. Mas no caso do artigo 137, o que está em questão é a eficácia no plano das relações jurídico-materiais, estabelecendo essa norma legal que a decisão interlocutória proferida quando se julga procedente o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, não declara, nem pode declarar a validez do ato jurídico objeto do pedido de desconsideração, senão que apenas a sua eficácia, com efeitos projetados sobre as relações jurídico-materiais firmadas entre o requerente do pedido e o sócio e/ou pessoa jurídica.
Há, evidentemente, efeitos processuais que o provimento jurisdicional faz produzir, porque se deve considerar a coisa julgada material, e não apenas a preclusão, porque se deve considerar que, conquanto se trate de uma decisão interlocutória, seu objeto é uma questão de mérito que, definitivamente decidida no processo, obsta que acerca dela se possa rediscutir, como sucede com a coisa julgada material em geral. Destarte, ainda que se cuide de uma decisão interlocutória, a decisão proferida em face do pedido de desconsideração da personalidade jurídica produz coisa julgada material, em condições bastante semelhantes àquelas que existem quando o juiz procede ao julgamento antecipado parcial de mérito (CPC/2015, artigo 356), devendo se reconhecer que, formulado o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, o pedido da demanda é ampliado, porque além do pedido inicial, acresce ao processo o pedido específico sobre a desconsideração, produzindo-se a coisa julgada material, malgrado se trate de uma decisão interlocutória.
A propósito desse interessante tema, que diz respeito à coisa julgada e a preclusão, de que tratou CHIOVENDA em 1933 em seu ensaio “Cosa Juzgada y Preclusión”, é importante destacar a acentuada mudança trazida pelo CPC/2015 com seu artigo 502 (“Denomina-se coisa julgada material a autoridade que torna imutável e indiscutível a decisão de mérito não mais sujeita a recurso)”, ao se referir, pois, à “decisão de mérito”, e não mais apenas à sentença, como fazia o artigo 467 do CPC/2015, com o que se deve concluir que, no regime do atual CPC/2015, e na esteira do que ensina CHIOVENDA, a coisa julgada material deve ser considerada como a decisão definitiva acerca de um bem “julgado”, o que sucede em geral com a sentença, mas também com as decisões de mérito, como se dá no caso da decisão que julga o mérito do pedido de desconsideração da personalidade jurídica, que, assim, faz coisa julgada material.