“Os dias antigos recobrem pouco a pouco aqueles que os precederam, e eles próprios se sepultam por baixo dos que se lhe seguem. Mas, cada dia antigo permanece depositado em nós, como, numa imensa biblioteca onde há livros mais antigos, certo exemplar que sem dúvida ninguém consultará nunca. Entretanto, basta que esse dia antigo, atravessando a translucidez das épocas seguintes, remonte à superfície e se estenda sobre nós, cobrindo-nos inteiramente, para que, por um momento, os nomes retomem sua antiga significação, as pessoas seu antigo rosto, nós nossa alma de então, e sintamos, com um sofrimento vago mas tornado suportável e que não vai durar muito, os problemas há tanto tempo insolúveis, e que de tal modo nos angustiavam então. Nosso eu é edificado pela superposição de estados sucessivos”. (PROUST, A Fugitiva, Em Busca do Tempo Perdido).

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