A maioria dos eleitores acaba de rejeitar o projeto de uma constituição, cujo texto havia sido elaborado por uma convenção criada e destinada especificamente à elaboração desse projeto. Com a rejeição ao projeto, a convenção desaparece, mas deixando um projeto. Surge, então, um interessante problema que não é apenas jurídico: o que está a viger agora é a Constituição de 1980, da era Pinochet, ou o Chile estará diante de uma espécie de vazio jurídico-constitucional criado com a rejeição ao projeto de uma nova constituição?

A grande maioria, senão que a exclusividade das teorias desenvolvidas pelos constitucionalistas foi pensada, engendrada, desenvolvida e aplicada quando as sociedades eram muito menos complexas do que são as nossas sociedades atuais, em que os grupos de interesses tornaram-se tão variados, que seria mais adequado dizer-se que existem grupos de subinteresses, tão fragmentados são esses  interesses, o que evidentemente projeta efeitos sobre o jogo de forças que é imanente à sociedade moderna complexa.

O fenômeno chileno é um exemplo perfeito para a comprovação de algo que foi lobrigado pelos sociólogos,  que somente mais tarde chamou a atenção dos filósofos, e que ainda hoje os juristas não compreenderam bem. Há, pois, a necessidade de um novo constitucionalismo, formado por uma teoria compósita que abarque o Direito, a Política, a Sociologia, a Filosofia e a Economia. Estão ultrapassadas as vetustas teorias constitucionais, produzidas para um tipo de sociedade que não existe mais.

Um constitucionalismo que leve necessariamente em consideração o multifacetado jogo de interesses e forças que atua na sociedade, pensando em normas constitucionais que, tanto quanto possível, correspondam a esses fragmentados interesses, como são aqueles que compuseram a proposta da constituição chilena, que ainda que rejeitada, representa o que subjaz na sociedade chilena, e que a rigor subjaz, na grande maioria dos aspectos tratados, em qualquer país com características semelhantes às do Chile.

Caberá a um constitucionalismo moderno enfrentar, pois,  o interessante tema do hiato que se instalou particularmente no Chile entre uma Constituição de 1980 (a da era Pinochet) que não se quer mais, como também não se quer o projeto elaborado por uma convenção, daí se devendo extrair o que poderá nortear o futuro do Chile. Tratando-se de um fenômeno que é imanente às sociedades complexas, pode-se supor que a experiência chilena poderá servir como um proveitoso laboratório para situações futuras.

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