As redes sociais provocaram uma discussão sobre o que se deve entender como “fake news”, e obviamente o tema passou a ser de interesse do Direito positivo, inclusive do nosso, na medida em que há a necessidade de a lei fixar o que juridicamente caracteriza uma notícia como falsa, o que pode a princípio parecer um conceito jurídico fácil de construir, mas que na realidade não é tão fácil assim.
Durante a Revolução Russa de 1917, dois jornalistas norte-americanos, WALTER LIPPMAN e CHARLES MERZ, produziram um ensaio em que analisaram como os jornais norte-americanos, sobretudo o New York Times, haviam feito a cobertura daquele fato histórico, e cuidaram assinalar um importante aspecto que até hoje permanece quase sempre esquecido quando se trata de analisar o papel dos jornais em face da verdade. LIPPMAN e MERZ sublinharam: “(…) as notícias como um todo são dominadas pelas esperanças dos homens que compõem as organizações jornalísticas. (…) Em grande escala, as notícias sobre a Rússia não são um caso de não ver o que estava acontecendo, mas sim ver somente o queriam ver”.
Esse trecho compõe o livro escrito pelo famoso jornalista e escritor, GAY GALESE, em que ele analisa a fundo o que foi e o que é ainda hoje o “New York Times”, estudando a intimidade desse que é o jornal mais importante do mundo.
Como observam LIPPMAN e MERZ, os donos de jornais, impondo seu poder a seus empregados jornalistas, impõe uma verdade, que é a verdade que eles, os donos desses jornais, querem ver publicada na página de seus jornais, escondendo o que não querem que o leitor veja. Caracterizar-se-ia a figura da “fake news” nessa situação, que é uma prática comum, quase que indissociável do jornalismo?
Daí a evidente dificuldade, senão que uma verdadeira impossibilidade de descrever sob um singelo enunciado de uma norma legal o que deve ser entendido por “fake news”, porque antes de se elaborar esse conceito será necessário fixar, em justos limites, o que é a liberdade de imprensa.
Pois que ao conceito de verdade se poderia aplicar o que FERNANDO PESSOA escreveu sob um de seus heterônimos, ÁLVARO DE CAMPOS: “tudo é diferente de nós, e por isso é que tudo existe”. O conceito de verdade é assim, um conceito compósito, formado por tudo o que pensamos, sem excluir o que outros podem pensar sobre a mesma coisa, e é exatamente em virtude dessa diferença que a Democracia pode e deve existir.