Muitas vezes o legislador considera ter sido tão claro e inequívoco no conteúdo da norma que elabora, que não pode supor que os juízes dela façam uma aplicação incorreta. Mas infelizmente isso ocorre.

É o que se dá com a clara e inequívoca norma do artigo 1.019, inciso II, do CPC/2015, que, tratando do regime jurídico-legal do agravo de instrumento, ordena  “a intimação do agravado pessoalmente, por carta com aviso de recebimento, quando não tiver procurador constituído, ou pelo Diário da Justiça ou por carta com aviso de recebimento dirigida ao seu advogado, para que responda no prazo de 15 (quinze) dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso”. 

Obriga a norma em questão que o relator do agravo de instrumento determine a intimação do agravo para que, no prazo legal, responda ao recurso, o que, de resto, constitui exigência do contraditório.

Alguns desembargadores, contudo, têm indevidamente deixado de aplicar essa clara e inequívoca norma, dispensando a intimação do agravado quando se trata de agravo de instrumento no qual se tenha concedido a tutela provisória de urgência (negada a princípio em primeiro grau). Pretextam esses desembargadores com a aplicação do artigo 9o., parágrafo 1o., inciso I, do CPC/2015, que dispensa um contraditório imediato quando o juiz analisa se é ou não caso de concessão da tutela provisória de urgência.

Olvidam os desembargadores de que o artigo 9o., parágrafo 1o., inciso I, tem sua aplicação limitada ao processo civil em primeiro grau, e não pode ser estendida a sua aplicação ao agravo de instrumento, que, vale lembrar, tem seu trâmite todo em segunda instância. Duas ordens de razão devem ser consideradas: a primeira é a de que o regime do agravo de instrumento está fixado nas normas dos artigos 1.015-1.020, no bojo de regras que se aplicam apenas ao trâmite de processos em segundo grau, caso do agravo de instrumento; a segunda razão é ainda mais óbvia, porquanto se deve considerar que a dispensa de um contraditório automático em primeiro grau pode ocorrer sem qualquer prejuízo ao devido processo legal, dado que, concedida a tutela provisória de urgência (cautelar ou antecipada), o réu terá oportunidades para exercitar o contraditório, seja na contestação, ou tão logo tome conhecimento da decisão pela qual foi concedida a tutela provisória de urgência. Essa oportunidade para exercer o contraditório, contudo, não existe no processamento do agravo de instrumento, porque o relator, quando dispensa a intimação do agravo, coloca o recurso para julgamento em colegiado, sendo certo, pois, que, julgado o recurso,  o agravado não terá então nenhuma ocasião para apresentar a sua resposta ao recurso. “Agora Inês é morta”.

O que prova que o legislador nunca pode supor que, em tendo feito uma norma clara e inequívoca, não haverá juiz que a possa aplicar com desacerto.

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