Que os processos judiciais devam ser públicos e que o sigilo deva ser excepcional, não há quem o conteste. Mas há processos cuja especialíssima natureza justifica um sigilo tão acentuado que não é direito da sociedade deles tomar conhecimento, porque entre o valor da informação e o da dignidade da pessoa envolvida no processo, este último valor é aquele a prevalecer. Destarte, o sigilo, nesses casos, deve ser tão abrangente que nem mesmo as iniciais dos nomes das partes, ou qualquer referência sobre existirem esses processos deve acontecer. É o que deveria ter ocorrido no caso da criança com dez anos, vítima de estupro no Espírito Santo, e que teve por ordem judicial autorizada a interrupção de sua gravidez. A imprensa noticiou o caso, revelou as iniciais da criança, informou acerca da ordem judicial e disse até o nome do hospital.
Nesse casos, parece óbvio dizer que o bem maior a ser protegido deve ser o da dignidade da criança, vítima de uma grave crime, o que justifica que houvesse acerca do processo em que se autorizou a interrupção da gravidez um sigilo, não digo absoluto, mas absolutíssimo, e que cabe ao Poder Judiciário zelar por uma efetiva proteção ao direito fundamental à dignidade da criança, o que se estende obviamente ao sigilo do processo.
O lamentável episódio nos ensina, ainda uma vez, que os direitos fundamentais não são absolutos, e que a liberdade de informar encontra limites na dignidade da pessoa humana. O legislador brasileiro, observando o que sucedeu nesse infeliz caso. aperfeiçoe as regras do sigilo nos processuais judiciais.
“A luz que a experiência nos dá é a de uma lanterna na popa, que ilumina apenas as ondas que deixamos para trás”, como observa Samuel Coleridge, e isso tem inteira aplicação no direito positivo, que pode, quando muito, legislar para o futuro, embora olhe para o passado.