A reforma previdenciária materializada na Emenda Constitucional de número 103 produziu importantes efeitos, e dentre eles sobreleva destacar aquele que suprimiu a isenção a parte da contribuição previdenciária de servidores públicos inativos, quando acometidos de doença grave. Essa isenção estava prevista no artigo 40, parágrafo 21, da CF/1988, e os Estados-membros a adotavam em sua legislação. Agora, em face da Emenda Constitucional 103, os Estados modificaram a sua legislação, e assim suprimiram a isenção à contribuição previdenciária, quando o valor supera o limite fixado pelo INSS.

E quem já se beneficiava da isenção nos moldes em que o artigo 40, parágrafo 21, da CF/1988 previa, pode ser afetado pela nova legislação? Em decisão proferida hoje, analisamos essa matéria sob o enfoque do direito adquirido.

Aqui o conteúdo da decisão, pela qual a tutela provisória de urgência de natureza cautelar foi concedida, assegurando-se o direito adquirido em favor do servidor público:


O autor é delegado de polícia em inatividade, beneficia-se da isenção de parte da contribuição previdenciária porque acometido de grave doença, e nesta demanda questiona norma da novel legislação do Estado de São Paulo que, baseada nas normas constitucionais aprovadas acerca do tema da reforma da previdência no setor público (Emenda Constitucional de número 103), suprimiu o direito à isenção sobre o valor que supere o teto fixado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, isenção que estava prevista no parágrafo 21 do artigo 40 da CF/1988, e que o Estado de São Paulo também adotava em sua legislação.
Segundo o autor, há que lhe reconhecer o direito adquirido à mantença do regime jurídico de isenção, sobretudo porque a causa determinante para a concessão da isenção, qual seja, a existência de uma grave patologia e o que se despende para seu tratamento, essa causa subsiste.
Concedo a medida liminar, por identificar, em cognição sumária, a presença tanto da plausibilidade jurídica, quanto de uma situação de risco concreto e atual, que coloca a esfera jurídica do autor sob essa situação de risco.
Quanto à plausibilidade jurídica. Em tendo o autor obtido o reconhecimento da isenção tributária (sobre parte do que deve suportar mensalmente em seus proventos a título de contribuição previdenciária), e em se mantendo como grave a patologia que suporta, e em função da qual a isenção a esse tributo foi-lhe concedida, há, em tese, o direito adquirido em favor de o autor manter essa situação jurídica, não podendo, a princípio, suportar efeitos decorrentes de uma nova lei, que estaria a indevidamente violar o direito subjetivo do autor.
Importante observar que não se nega ao Poder Público a modificação das condições para a isenção em matéria tributária, ou mesmo para suprimir a isenção tributária, dado que se impõe reconhecer a discricionariedade do Poder Público nessa matéria. O que, contudo, não é dado ao Poder Público fazer é suprimir, obliterar ou desconsiderar um direito subjetivo que, configurado em sua existência (validez e vigência) e que se revela eficaz, porque nesse caso a nova norma afronta o direito subjetivo, a que a norma constitucional confere especial proteção quando se configura o que o Direito de há muito denomina como “direito adquirido”.
Destarte, se o autor obteve o reconhecimento do direito subjetivo à isenção tributária quanto à parte do valor da contribuição previdenciária, porque, segundo a norma então em vigor, a imunidade lhe deveria beneficiar, já que portador de doença grave, se essa situação clínica (a patologia grave) continua a existir, a norma que previu a isenção continua a produzir efeitos ao longo do tempo (durante o tempo, pois, em que a patologia persistir), porque estará aí configurado o direito adquirido à mantença da isenção, dado se cuidar de um direito subjetivo definitivamente incorporado à esfera jurídica do autor.
Poder-se-ia argumentar que a novel norma é de matriz constitucional. Não importa, porque também a ela se deve opor a especial proteção conferida por outra norma constitucional, de maior valor, que é a norma que assegura especial proteção ao direito adquirido, norma, aliás, que objetiva a proteção da segurança jurídica.
De modo que o autor não poderia, em tese, suportar em sua esfera jurídica de sujeito passivo da contribuição previdenciária quaisquer efeitos decorrentes de uma nova legislação, ainda de que natureza constitucional, porque a sua esfera jurídica, ou seja, a mantença da isenção estaria protegida pela especial proteção decorrente do direito adquirido.
Quanto à situação de risco concreto e atual, é evidente que o autor, dele se suprimindo a isenção tributária, suportaria imediatamente prejuízos que podem se tornar irreversíveis.
Assim, concedo a tutela provisória de urgência de natureza cautelar, para desobrigar o autor de suportar efeitos decorrentes da novel legislação, o que significa dizer que se lhe assegura a mantença da isenção à parte da contribuição previdenciária, de que se beneficia há tempo, formando aí uma condição jurídica acerca da qual o direito adquirido impediria qualquer modificação, ou nomeadamente a supressão dessa condição jurídica. Intimem-se as rés para que, em 48 horas, cumpram esta Decisão, sob as penas da Lei.
Cite-se.
Int.

 

 

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