De tempos em tempos renovam-se as queixas e reclamações quanto a uma suposta proxilidade da Constituição de 1988, a qual, assim, teria o defeito de “ter remédio para tudo”. Esse tema voltou à moda.
Uma constituição – que é a lei fundamental para reger a vida em suas diversas relações de caráter jurídico, devendo por isso refletir o estágio de civilização e de cultura de um país – deve, sim, ter respostas para tudo, sendo essa, de resto, a primordial função daqueles princípios gerais que integram e devem integrar seu texto, como é o caso, por exemplo, do princípio da moralidade administrativa, e de outros princípios que se aplicam à Administração Pública, previstos no artigo 37. Uma constituição que não oferece essas respostas pode ser tudo, menos uma constituição. Tanto melhor, pois, que ela supedite mais e mais respostas para problemas presentes e futuros, que é exatamente para isso que uma constituição deve existir.
Lembremos do ambiente sociopolítico em que vivíamos quando se instalou a assembleia nacional constituinte em 1987: acabávamos de sair de uma extensa e pesada ditadura militar, materializada sobretudo nos atos institucionais, os quais haviam imposto uma série de limitações ao Poder Judiciário e aos direitos dos cidadãos. Natural, por isso, que o legislador constituinte tivesse uma preocupação maior na explicitação daqueles direitos fundamentais que deveriam guiar o país em um futuro democrático, o que justifica a extensão do texto de 1988. Os constitucionalistas afirmarão, sem dúvida, que a Constituição de 1988 é a mais original das constituições brasileiras, e sob certo aspecto histórico, a mais importante delas.
Que direito fundamental está a mais no texto de 1988? Que princípio constitucional ali sobeja? Que garantia jurisdicional pode ser suprimida?
Ademais, não esqueçamos que uma constituição não faz sozinha seu papel. Ela necessita do trabalho do juiz, que, com seriedade, rigor, responsabilidade e inteligência deve se esmerar por extrair do texto o que de melhor uma constituição lhe possa oferecer. Daí a importância da hermenêutica constitucional, que no Brasil, diante da convivência entre os regimes de controle concentrado e difuso de constitucionalidade, é exercida não apenas pelo Supremo Tribunal Federal, mas por todos os juízes.
Quem critica o texto constitucional de 1988 pela abertura conceitual que ele propicia o faz sem conhecimento, e por isso sem razão – e quase sempre com interesses corporativos.